Um dia infernal para a memória humana
Carlos Araújo
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Varsóvia se destacava por suas belezas barrocas e seus 25 teatros. A capital da Polônia, conhecida como "a Paris da Europa Oriental", entrou em rota de colisão com a catástrofe num dia como hoje. Era 1º de setembro de 1939.
Naquele dia, Hitler invadiu a Polônia e traçou um destino de ruínas devastadoras para o país de Bruno Schulz e Czeslaw Milozs. E Varsóvia entrou para a categoria de cidades castigadas pela loucura humana como Hiroshima e Nagasaki, Dresden, Leningrado, Stalingrado.
Para um país de 30 milhões de habitantes, Hitler articulou a invasão com 1,5 milhão de alemães, ante 1,3 milhão dos defensores poloneses. Os exércitos eram compostos de 37 divisões de cada lado. Mas a desproporção em favor dos alemães era muito superior.
O historiador britânico Max \Hastings, em seu livro Inferno -- o mundo em guerra: 1939/1945, conta que os alemães tinham 3.600 blindados, e os poloneses, 750. As divisões de Hitler contavam com 1.929 aviões modernos, enquanto que os poloneses tinham 900 aviões obsoletos.
O ataque foi um "passeio" alemão. Vindos das frentes norte, sul e oeste, os alemães encontraram fraca resistência. Tanques Panzer e ataques aéreos arrasaram Varsóvia e várias outras cidades. Soldados e civis poloneses foram metralhados e bombardeados sem piedade.
A Polônia aguardava o prometido apoio da Inglaterra e da França. Mas essas duas nações se limitaram a uma formalidade de declaração de guerra a Hitler, três dias após a invasão, sem mobilização de tropas nessas primeiras frentes de batalha da Segunda Guerra Mundial. Os poloneses morreram e sofreram sozinhos. Foram vítimas de um banho de sangue marcado por traição, desamparo, brutalidade.
Max Hastings choca ao descrever o sentimento dos comandantes invasores a mando de Hitler. Eric von Manstein, tido como o melhor general alemão na guerra, ignorava os massacres promovidos por suas tropas e vangloriava-se da glória feita de cadáveres numa Polônia arrasada. "Em 1939, o corpo de oficiais da Wehrmacht (tropas nazistas) já demonstrava a falência moral que caracterizaria sua conduta até 1945", conclui o historiador.
E, como se não bastassem os alemães, os russos também invadiram a Polônia pelo leste naqueles dias infames. Entre os poloneses que sobreviveram, milhares foram feitos prisioneiros. Hastings calcula que cerca de 1,5 milhões de poloneses, na maioria civis expulsos de suas casas na parte oriental do país, enfrentaram o cativeiro e a fome nas mãos dos russos. E essa face da tragédia custaria a vida de 350 mil pessoas.
A invasão russa (soviética, na época) culminou com o massacre de aproximadamente 25 mil poloneses em março do ano seguinte, 1940, quando, por ordem do ditador Josef Stalin, as vítimas foram eliminadas com um único tiro na nuca. Essa execução em massa ocorreu em várias prisões russas. Os corpos foram queimados em valas comuns em várias cidades e florestas em território russo.
Segundo estimativa de Max Hastings, a invasão causou 70 mil mortes de poloneses, ante a morte de 16 mil alemães. Nos seis anos da guerra, morreram mais de cinco milhões de poloneses. Desse total, 110 mil perderam suas vidas em combate e os restantes em campos de concentração alemães e também nas mãos dos russos.
O historiador britânico informa que não há consenso quanto ao número de mortes produzido pela Segunda Guerra no mundo inteiro, mas acredita que um mínimo de 60 milhões é um volume que pode ser aceito, com prováveis 10 milhões a mais.
Nesse conjunto, as perdas russas foram estimadas em 27 milhões de mortos; a China, 15 milhões; a Alemanha, 6,9 milhões; as Filipinas, 1 milhão, a Itália, 300 mil militares e 250 mil civis; a França, 567 mil; a Inglaterra, 449 mil; os EUA, 418.500. Romenos, coreanos, gregos, iugoslavos, tchecos, canadenses, australianos, neozelandeses, indianos, brasileiros, entre outros, completam esse triste balanço.
"O aspecto mais notável das estatísticas é que o fardo mais pesado coube aos países que sofreram ocupação inimiga ou cujos territórios se tornaram campos de batalha", conclui Max Hastings.
E pensar que tudo começou num dia como hoje, em 1º de setembro de 1939. Quem começa uma guerra nunca sabe como. nem quando ela termina. Legados deveriam servir de alerta para que as tragédias não se repitam. Se o homem deve extrair lições das grandes catástrofes, tudo leva a crer que ele ainda não aprendeu nada.