SOROCABA E REGIÃO

Autoestima é fundamental para lutar contra o câncer de mama

Quando uma mulher recebe o diagnóstico que está com câncer de mama, a parte mais dolorida não é o desafio do tratamento, mas o fato da doença mexer com o que ela tem de mais feminino: seus seios. "A mama é a nossa parte sagrada, é o que dá alimento ao filho, é o que nos sensualiza, nos deixa mais bonitas", observa a médica Elisa Maria Neiva de Lima Vieira, presidente do núcleo sorocabano da Sociedade Brasileira de Psico-oncologia.

Por conta de toda a simbologia em torno das mamas, ter um tumor maligno nesse local pode abalar a autoestima. Nesse sentido, a mastologista Alice Francisco fala da importância de cuidar dos sentimentos que surgem após o diagnóstico. "O pensamento positivo atua no enfrentamento da doença, é uma forma de arranjar forças para lutar."

Alice afirma que as pessoas estão acostumadas a associar a autoestima apenas à aparência, mas a autoestima é mais do que isso. "É trabalhar o emocional. Ela começa de dentro para fora", ressalta. Quando a pessoa está bem consigo mesma, ela consegue aceitar o que está passando. "A autoestima é importante para se manter firme perante as mudanças que essa mulher enfrentará." Por isso, contar com o apoio de uma psicóloga, de preferência com especialização em psico-oncologia, pode ajudar muito.

É um momento em que as pacientes se sentem mais à vontade para dizer o que estão sentindo, falar sobre o medo de enfrentar a doença. "E a partir daí a coisa muda, elas encontram uma força muito grande dentro de si."

É um momento, ainda de acordo com a mastologista, em que a mulher passa a assimilar a dimensão da doença na vida dela e aceitar viver o momento. "Ela percebe que isso acaba tendo um significado, um aprendizado, e que poderá tirar uma lição disso, ressignificar algumas coisas para ela."

A quimioterapia e os cabelos

Ao iniciar o tratamento com quimioterapia, o prazo é de 15 dias para mais um símbolo feminino ruir: vem a queda dos cabelos. "Mas como o interior reflete no exterior, a mulher que já está nesse processo de aceitação da doença começa então a se enfeitar, colocar um lenço, fazer uma maquiagem diferente, usar brinco grande... Ela encontra outros pontos em que se apoiar, pois sabe que sua beleza está além do cabelo. Por isso o mais importante é reforçar a autoestima."

Além do apoio psicológico, a paciente conta com o suporte de uma equipe multidisciplinar muito grande, que visa o atendimento integral. Então apesar do sistema público de saúde deixar muito a desejar, as entidades assistenciais e ONGs que atuam em Sorocaba contam com toda sorte de profissionais como fisioterapeuta, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, reflexologistas, educadores físicos, nutricionistas e enfermeiras oncológicas.

Outro ponto importante no tratamento é o apoio de outras mulheres que estão passando ou passaram pela doença. "É muito importante ter essa integração, elas passam a saber de histórias positivas e isso também ajuda na autoestima. A gente nota a diferença dessas pessoas ao longo do tempo."

Luto e renascimento

"A mama nos representa enquanto mulheres e aquelas que enfrentam a doença vivem o luto da perda dessa parte do corpo", afirma a psico-oncologista Elisa Maria Neiva de Lima Vieira, acrescentando que mesmo aquelas que não precisam fazer a retirada, vivem a dor de não estar com a mama sadia. "Então existe um entristecimento muito grande e algumas entram em depressão." Durante a doença, a relação da mulher com o seu corpo é de cuidados.

Geralmente quando vem o diagnóstico, a mulher precisa lidar com o choque da notícia. "Para muitas vem a negação, a cancerofobia, que é a fobia em relação ao diagnóstico, a não aceitação da doença. O acompanhamento psicológico irá ajudar a ter subsídios emocionais para fazer o tratamento."

Já quando ocorre a mutilação da mama, entra uma etapa mais difícil. "É chocante para a mulher. Ela não se reconhece. Tem pacientes que se negam a olhar no espelho, até que possam compreender que existe a possibilidade de reconstrução."

O câncer atinge também a parte sexual, mas de acordo com Elisa Maria, geralmente o que se observa é um companheirismo intenso do parceiro, um apoio e suporte emocional forte. "Mas há casos em que os parceiros se negam a manter relação sexual vendo o corpo inteiro da paciente. Em algumas situações, elas acabam sendo abandonadas".

Superada a fase inicial, a autoestima ganha um novo colorido. "O que observo é que não é a mesma de antes, mas melhor. A mulher passa a valorizar questões que antes não valorizava, passa a ver a vida de outra maneira, e a sua segurança vem com um intensidade maior, ela se vê mais forte e se reconhece como uma fênix."

Aceitação da doença passa por muitas fases
Quem olha para a professora aposentada Flávia Campos Oliveira, 56 anos, nota que é uma mulher bem cuidada, com maquiagem feita, e a natural vaidade feminina, em que não pode faltar um brinco e uma corrente. O tom de blusa, vermelho vivo, é de quem gosta de se sentir “pra cima”. Mas mais do que sua aparência, basta conversar um pouco com ela para perceber o quanto essa beleza está é por dentro. Flávia fala com a segurança de quem sabe a que veio e seu olhar guarda um brilho diferente, o da certeza da superação.
Ela recorda que há oito anos recebeu o diagnóstico de câncer de mama. Confessa que já desconfiava, mas a notícia a abalou muito. “Quando soube, fiquei sem chão”, conta. Assim como outras mulheres, ela percebeu que algo estava errado pela aparência do seio esquerdo, que ficou diferente. “Eu ia viajar e deixei para ir ao médico depois, mas quando voltei já estava com nódulo grande”, diz. Ia ter de tirar a mama inteira. “Fiquei revoltada, desiludida”, lembra, mas a possibilidade de reduzir o tumor fazendo quimioterapia a confortou. “Consegui reduzir o tamanho, então a cirurgia retirou só uma parte do seio.” Flávia usa prótese e recebe acompanhamento da Liga Sorocabana de Combate ao Câncer, lugar que considera o seu ponto de bem-estar. Foi apenas quando conheceu essa entidade e passou a fazer as atividades oferecidas ali que recuperou sua autoestima e atualmente já pensa em fazer a reconstrução da mama. Até chegar a esse momento de aceitação da doença, Flávia passou por muitas fases, e foi caindo e se levantando que ela aos poucos foi vencendo cada etapa. Ela lembra que o câncer de mama se espalhou pelo ombro, pelo braço, coluna e chegou até a boca. “Corri o risco de cair o maxilar”, recorda. Toda essa situação a deixava muito deprimida, principalmente porque sentia muita dor. “Cheguei a ficar deitada no chão e sem querer olhar na cara das pessoas que iam me visitar, mas aí eu pensava na minha filha e reagia.” Há dois anos frequentando a Liga, Flávia conta que conseguiu se erguer emocionalmente. “A gente se vê mutilada sabe, mas agradeço muito as fisioterapeutas e suas orientadoras”. As fisioterapeutas fazem drenagem linfática em Flávia. “Como meu braço não drena naturalmente, a linfática é importante para mim, fica mais desinchado. Lá também faço ginástica”, conta, acrescentando que o trabalho da Liga envolve muito acolhimento. “Todos os oncologistas deveriam encaminhar as pessoas para lá, muita gente não conhece”, diz. Essa nova forma de quimioterapia, por meio de comprimidos, não provoca a queda dos cabelos e não tem efeitos colaterais, comenta Flávia. Ela aconselha as mulheres sempre estarem de olho e irem ao ginecologista periodicamente. “Eu não tinha nenhum caso na família, então pode acontecer com qualquer pessoa. Ao perceber um sinal diferente, tem de correr. O segredo é procurar se apegar com Deus e assim a gente vence.”