UNISO CIÊNCIA

Pesquisadora desenvolve hidrogel para tratamento de feridas vaginais em pacientes com câncer


Como ajudar mulheres pacientes de câncer que fazem quimioterapia ou radioterapia e que sofrem de problemas de feridas na cavidade vaginal a terem um tratamento mais específico e que elas mesmas possam tratar essas feridas de maneira mais fácil. Esse foi o propósito que levou a farmacêutica Thais Francine Ribeiro Alves a pesquisar e desenvolver um hidrogel termorresponsivo que se fixa melhor na parede vaginal e ajuda, por meio da aplicação de curcumina, no tratamento da ferida.

“A administração vaginal de fármacos tem como principais vantagens evitar o metabolismo hepático, reduzir a incidência e severidade dos efeitos gastrintestinais secundários e diminuir efeitos secundários hepáticos de fármacos”, descreve ela.

O resultado obtido foi satisfatório, segundo análise da pesquisadora. Alves conseguiu desenvolver um hidrogel termorresponsivo que pode ser aplicado nas feridas da parede vaginal pelas próprias pacientes, com o auxílio de de um aplicador no formato de uma seringa.

O hidrogel, ainda bastante solúvel, é carregado de curcumina, que tem características anti-inflamatória, antifúngica, antimicrobiana e cicatrizante. Ao ser inserido na cavidade vaginal e atingir uma certa temperatura, esse hidrogel se torna um gel de boa viscosidade e com propriedades bioadesivas, ou seja, que gruda na parede vaginal e libera a curcumina aos poucos.

Ela fez essa pesquisa ao longo de seu mestrado, finalizado em 2016, dentro do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da Universidade de Sorocaba (Uniso). A pesquisa foi orientada pelo professor doutor Marco Vinícius Chaud e desenvolvida nas dependências do Laboratório de Biomateriais e Nanotecnologia da Uniso, que fica no Parque Tecnológico de Sorocaba (PTS).

Alves conta que decidiu por este estudo pois pesquisou a mucosite oral na graduação, em pacientes com câncer na cabeça e pescoço, e, quando se propôs a fazer o mestrado, teve a ideia de pesquisar e ajudar o problema da mucosite vaginal em mulheres que fazem tratamento de quimioterapia e radioterapia da cavidade abdominal ou colo de útero.

Durante o mestrado, que durou dois anos, ela teve como primeiro desafio encontrar um tipo de polímero (há inúmeros, tanto naturais quanto sintéticos, cada qual com propriedades distintas) que apresentasse características ideais para o tratamento na cavidade vaginal. “A via vaginal é um desafio para a formulação de formas farmacêuticas para liberação modificada de fármacos. Entre os principais desafios está o tempo de permanência da forma farmacêutica no local de aplicação e a área de superfície no contato com a mucosa vaginal”, relata Alves, no estudo. Além disso, era preciso achar um composto onde a curcumina se diluísse.

CURCUMINA
Ocorre que a curcumina, que é um composto fitoquímico de cor amarelo-alaranjado, obtido a partir do rizoma do açafrão (Curcuma longa) e que cresce naturalmente na Índia e em outras partes do sudeste da Ásia, é conhecida por ter uma baixa solubilidade em água. “A sua solubilidade é limitada em meios orgânicos comuns, como etanol e óleos vegetais, o que torna difícil a preparação de formulações líquidas convencionais.”

A curcumina vem sendo amplamente estudada por suas características antifúngica, antimicrobiana, cicatrizante. “Diferentes estudos têm demonstrado sua baixa toxicidade intrínseca e ampla variedade de efeitos terapêuticos”, cita Alves, na pesquisa.

Apesar dos diversos efeitos terapêuticos, a utilização clínica de curcumina é restringida por baixa biodisponibilidade oral, devido à baixa solubilidade em água, instabilidade em valores de pH neutro e alcalino, metabolismo extensivo e rápida eliminação.

ETAPAS
“Logo que eu entrei no mestrado, a gente conseguiu adquirir o material antes, via projeto. Então, acho que uns quatro ou cinco meses, eu trabalhei só com as dispersões sólidas da curcumina. Foi a primeira etapa do trabalho”, conta Alves. A dispersão sólida são formulações farmacêuticas utilizadas com o objetivo de melhorar a solubilidade de compostos pouco solúveis em água. Nessa parte da pesquisa, Alves trabalhou com 18 amostras e obteve resultados favoráveis em três delas.

Depois dessa etapa, Alves começou a pesquisar e analisar o preparo dos hidrogéis termorresponsivos (que têm alguma alteração conforme variação da temperatura), sem a adição da curcumina. Nessa etapa, que durou cerca de sete meses, ela pesquisou e testou 8 amostras. Duas delas tiveram resultado satisfatório e foram, depois, testadas com a adição de curcumina na etapa seguinte.

Só depois de testados e caracterizados esses hidrogéis que melhor se encaixariam na amostra de curcumina é que Alves passou a testar 12 amostras de hidrogéis adicionados com a curcumina. Foram mais seis meses avaliando os hidrogéis com a curcumina.

HIDROGEL TERMORRESPONSIVO
Uma das grandes dificuldades de Alves, foi modular a temperatura de um hidrogel para que ele passasse do estado líquido (na temperatura ambiente) para o estado de gel, com viscosidade e aderência corretas para que aquele composto ficasse aderido à parede da vagina e liberasse gradativamente a curcumina no ferimento.

“Hidrogéis termicamente sensíveis ou termorresponsivos têm sido foco de estudos devido sua praticidade na aplicação e baixos efeitos indesejáveis. Em concentrações adequadas apresentam transição de fase líquida para gel (Tsol-gel), próxima ou igual à temperatura corpórea. Essa transição Tsol-gel pode ser modulada de acordo com a concentração do polímero ou associação com outros polímeros e agentes reticulantes.Geralmente, as temperaturas de gelificação são consideradas adequadas na faixa de 25 – 37°C”, explica Alves, em sua pesquisa.

“Esse hidrogel termorresponsivo tem característica líquida na temperatura ambiente, que é o que vai permitir a gente colocá-lo na seringa e fazer a administração vaginal. Quando ele atinge uma temperatura, ele se transforma em gel. E isso faz com que ele fique todo na parede da cavidade vaginal e fique aderido, sem escorrer. Então, eu trabalhei em todo o mestrado para conseguir modular essa temperatura. O que seria modular? É exatamente em que ponto ocorria essa transição Tsol-gel, que é a transição de solúvel para gelificado, então, é trabalhar nesse ponto.”

Mas encontrar o ponto de transição não foi o único trabalho dela ao longo dos anos pesquisando esse tema. Dentre os inúmeros testes feitos a cada etapa da pesquisa, Alves também fez o teste de viscosidade do hidrogel termorresponsivo. Ela explica que “na aplicação de produtos tópicos na cavidade vaginal, a viscosidade e a mucoadesão contribuem para fixar a formulação sobre a mucosa epitelial. Esta propriedade também contribui para controlar a liberação de fármaco e melhorar a adesão ao tratamento com produtos nas formas farmacêuticas de gel, creme ou pomada.”

Outro teste avaliado é a propriedade mecânica do hidrogel, para que o composto não escape e coloque a perder o tratamento. “As redes poliméricas dos hidrogéis devem possuir propriedades mecânicas capazes de resistir a estresses físicos e químicos e, ao mesmo tempo, proporcionar um contato íntimo e prolongado com a superfície da mucosa. O tempo de permanência do hidrogel no local de aplicação é influenciado pela renovação do fluído vaginal (transudato e muco vaginal) e pela reticulação dos polímeros. O equilíbrio entre o efeito do fluido vaginal e a resistência mecânica dos polímeros pode ser medido pela dureza, coesividade, compressibilidade, adesividade e mucoadesão do hidrogel termorresponsivo”, explica Alves, na dissertação.

RESULTADOS SATISFATÓRIOS
Alves ficou feliz com os resultados encontrados. Ela diz que, apesar de serem necessárias novas pesquisas para que efetivamente um produto seja feito a partir dos resultados obtidos em sua pesquisa e chegue às prateleiras das farmácias, seus estudos mostraram que é possível produzir um composto à base de hidrogel com curcumina para o tratamento vaginal.

“Com os resultados que a gente obteve no estudo, o sistema apresenta potencial para a veiculação da curcumina. O sistema em si apresenta potencial também para a veiculação vaginal, ou seja, o sistema é eficaz tanto para a veiculação e transporte dessa curcumina até o local de ação, quanto o mecanismo de ação que ele vai ter dentro da cavidade vaginal. Ele consegue formar esse filme na temperatura corpórea. Então, o grande desafio foi aumentar essa solubilidade da curcumina e conseguir sua veiculação no meu hidrogel e criar um hidrogel que fosse capaz de ter essa transição líquido-gelificada dentro da cavidade vaginal. Então, enquanto um estudo de desenvolvimento e avaliação do sistema, a gente teve resultados promissores para uma futura análise em animal e, quem sabe, em humanos”.

Texto elaborado com base na dissertação “Desenvolvimento e avaliação de hidrogéis termorresponsivos para administração vaginal e veiculação de curcumina”, do Programa de Pós-  -Graduação em Ciências Farmacêuticas da Universidade de Sorocaba (Uniso), elaborada sob orientação do professor doutor Marco Vinícius Chaud e aprovada em 2016. Acesse a pesquisa: https://goo.gl/T5NiFg


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