Como protagonista de 'Rei Davi', na Record, Leonardo Brício vive seu apogeu na tevê
* Mariana Trigo -TV Press
Leonardo Brício passou por uma verdadeira imersão no último ano para se transformar em Davi, o rei de Israel que viveu por volta de 1000 anos a. C. Em "Rei Davi", minissérie bíblica da Record, o ator de 48 anos vive seu ápice desde que estreou na tevê em uma participação em "Tieta", na Globo, há 23 anos. De lá para cá, teve passagens por produções na extinta Manchete e no SBT, até se estabelecer na Record desde sua estreia em "Cidadão Brasileiro", há seis anos. Com contrato com a emissora até 2014, Leonardo se debruçou sobre pesquisas e "workshops" durante meses. Tudo para trazer verossimilhança ao que seria este guerreiro, músico e poeta, mais conhecido por sua vitoriosa luta contra o filisteu Golias no Velho Testamento.
No entanto, Leonardo assegura que foi além. Na produção de Vivian de Oliveira, o ator não se poupou em treinamento. Para dar vida ao rei popular - que começou a vida como pastor de ovelhas, tocando harpa e entoando cânticos, até se transformar no guerreiro que unificou todas as tribos -, Leonardo aprendeu hebraico, gravou em áridas locações no Canadá, lutou esgrima e mergulhou em estudos sobre o missionário. "Sem dúvida, este é o trabalho de maior importância na minha trajetória. Esse personagem me deu exemplos de lealdade, amizade e honradez. É um papel extremamente humano, complexo e fascinante", empolga-se.
P - O Rei Davi é o papel de maior repercussão em sua carreira. Como reagiu quando soube que iria interpretar este protagonista épico de uma história bíblica?
R - Pensei: "É meu!" (risos). Quando começaram a planejar a minissérie na Record, lembrei que muito tempo atrás, em uma festa, uma figurinista olhou para mim e disse que eu era a cara do Rei Davi. Comecei a viajar na história e fui ler trechos dele na Bíblia, porque só conhecia a história até o embate com Golias. Fiquei fascinado e torcendo para ser escolhido. Quando me ligaram da emissora, não foi para fazer um teste. Foi para me chamar para o papel e me apresentar as três fases e convencer a direção da emissora de que eu deveria fazer o Davi. Esperei um tempo ansioso pela decisão. Esse é o trabalho mais difícil, mais intenso e completo da minha carreira. É tão denso que, fazer "Rei Davi", foi como atuar em quatro longas.
P - Como foi a composição de um personagem que viveu 1000 anos antes de Cristo?
R - Assisti a alguns filmes, inclusive sobre a história do Rei Davi. Foi para ter uma noção de como Hollywood imaginou que ele era, como representou a época. Tem um filme bem antigo, que não lembro o nome, que é meio tosco, rústico, que retrata melhor o que seria. Quando eu leio sobre um personagem, uma história, tento entendê-lo e procuro saber por que me escalaram para fazer. Um dos motivos de ser escolhido para Davi é porque não sou tão novo e não aparento ser tão velho quanto sou (risos). Tenho 48 anos. Posso fazer ele mais jovem e mais velho, em várias etapas da vida. Interpreto ele dos 28 aos 70 e poucos anos. Tive aulas da época com um historiador e, desde criança, assistia a muitos filmes bíblicos e adorava, como "Os 10 Mandamentos" ou "O Manto Sagrado".
P - Para atravessar a trama com o personagem, como tem sido o processo de caracterização dele?
R - O cabelo é meu mesmo, sem apliques. Mas clareei porque o Davi é ruivo na Bíblia. Também coloquei lente mais clara. Para fazê-lo aos 28 anos foi mais fácil. Só escureci a barba branca (risos). Aos 40, coloco um pouco mais de barba e o cabelo muda um pouco. Já com 50 anos, ele muda bastante. Fica mais acabadinho, com olheiras, ruga na testa e bem grisalho. Aos 70, ele vira Moisés (risos). A partir das cenas dele com 50 anos, já começo a usar máscaras de látex de caracterização, com próteses. Aos 70, a cara inteira é coberta de próteses. O trabalho é perfeito. O caracterizador Vavá Torres arrasou. O difícil mesmo foi fazer todas as sequências fora da ordem cronológica. Tinha de ter na minha cabeça a continuidade do que eu iria fazer. Foram cenas desordenadas em uma história muito grande, com muitas emoções. Não tínhamos drama cotidiano de novelinha. Trabalhamos com tragédias: mortes, estupros, gente que entrega a cabeça de alguém na bandeja. É punk!
P - Você se identifica com alguma religião? Como tem sido se aprofundar em uma história bíblica?
R - Tenho todas as religiões. Já estudei em colégio de padre, minha família é espírita, já participei de umbanda, siddha ioga, já transitei por todos os lados. Mas não sou praticante de nenhuma religião. Acredito em todas e no dia a dia procuro fazer o bem.
P - De alguma forma, a minissérie chegou a mudar sua visão religiosa?
R - O Davi era um cara muito ligado à natureza e eu também me identifico com isso. Deus está na natureza. Ele conversava com Deus e cuidava de ovelhas. Tenho isso. Sou muito bicho do mato. Também tenho essa sensibilidade de falar com Deus através da natureza. Assim que eu me comunico espiritualmente.
P - Essa minissérie foi o maior investimento da Record na teledramaturgia até hoje. Foram R$ 25 milhões gastos nesse produto. Isso teve um peso diferenciado nesse trabalho?
R - É muita responsabilidade, né? É só olhar os cenários ao redor e ver o capricho, o acabamento. É tudo muito grandioso e bonito. São figurinos, cenários e locações deslumbrantes. É um trabalho para ganhar prêmio, não tenho a menor dúvida. Só não ganha se não quiserem dar, porque a concorrente leva tudo. Não precisa ficar vendo "BBB", bunda e peito. É melhor assistir a "Rei Davi".
P - Você fez papéis de destaque na Globo, como o Tiago Olinto, da minissérie "A Muralha", o Enrico Mezenga de "O Rei do Gado" e o Ricardo, de "Anjo Mau". Quais as maiores diferenças que sentiu ao mudar de emissora?
R - Muita gente que está hoje na Record era da Globo. Não sinto muita diferença. Apenas as distinções mais estruturais mesmo, porque a Record está começando na teledramaturgia, cometendo erros que a Globo deve ter cometido anos atrás. A Globo também não está livre de errar. Atualmente, teledramaturgia na Record é um mercado de trabalho importantíssimo. Mas não dá para falar do todo da dramaturgia na emissora sem falar sobre "Rei Davi", que está à frente de muita coisa que já se fez na Globo, sem a menor dúvida.
P - O que mais motivou você a ir para a Record?
R - Eu estava sem contrato na Globo. Tinha terminado "Da Cor do Pecado" e só fazia teatro. Quando fui para a Record, a emissora deixou que eu conciliasse tevê com teatro. Ela respeitou isso, que é vital para mim. É onde eu aprendo. Não posso parar nunca.
P - Muitos dos seus personagens na tevê, assim como Davi, têm algo rústico, mas não deixam de ser sensíveis. A que você atribui ser escalado para esses tipos quase contraditórios?
R - O legal do trabalho do ator é poder fazer tudo, desde um "bon vivant", como o Ricardo, em "Anjo Mau", a um rústico papel em "A Muralha". Engraçado, porque dentro dos rústicos, eu realmente era sempre pincelado com uma visão mais sensível, como em "A Muralha". Meu personagem queria descobrir ouro e não escravizar os índios. O Davi é rústico, mas é um artista, é super sensível. Tenho os dois lados. Sensibilidade e rusticidade. Isso vem de ser um homem do campo, da natureza, de gostar de bicho, de cavalo, de ter sítio e ser criado em fazenda. Sempre andei muito a cavalo nas tramas, por isso entendo porque passo essa imagem mais campestre.