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O videogame não é mais brinquedo!


A história do videogame teve seu início no final da década de 1950, quando o físico nuclear William Higinbotham criou uma tecnologia que permitiu a manipulação de objetos numa tela. Tennis for two possibilitou que dois jogadores controlassem uma bolinha, como uma partida de tênis, através de um osciloscópio. Apesar da aceitação pública, o cientista não apostou que sua invenção pudesse mudar a cultura de parte da humanidade, deixando-a como objeto exclusivo do Brookhaven Nacional Laboratory, EUA.
 
Assim como Higinbotham, estudantes de eletrônica do MIT se aventuraram em entender as máquinas de computadores que, até então, só haviam sido usadas militarmente. Steve Russel desenvolveu junto ao grupo um jogo para computadores chamado Spacewar!, baseado em uma batalha espacial. Todavia, o jogo não foi registrado e ficou à disposição para que outras pessoas pudessem estudá-lo e alterá-lo.
 
As produções para fins comerciais só ocorreram a partir de 1966, quando o engenheiro Ralph Baer criou um equipamento eletrônico capaz de ser ligado a um aparelho televisor. Em 1971, sua criação foi licenciada pela empresa de televisores Magnavox e transformou-se no Odyssey, dando início a indústria do videogame. Ocorre que essa história sempre esteve atrelada a altos e baixos, pois os produtos se tornavam ultrapassados em um curto espaço de tempo, devido ao avanço tecnológico. Ao longo dos anos, empresas como as famosas Atari, Sega e Nintendo travaram guerras a fim de disputar o mercado que logo alcançaria a receita da indústria hollywoodiana.
 
Os jogos que antes não possuíam complexidade passaram a oferecer conteúdos similares aos de filmes, mas com uma grande diferença: neles o telespectador deixa a função passiva e assume a história, manipulando-a, explorando espaços e tomando as decisões. Estudos da área apontam que, ao jogar, a pessoa desenvolve habilidades como concentração, reflexo, coordenação motora, além de exercitar constantemente a reflexão.
 
O ponto negativo que mais envolve a área de jogos digitais é a ideia de influência sobre a violência. Para tanto, existem estudos, como os do filósofo Huizinga, que defendem que, ao jogar, o indivíduo se desliga do mundo real, vivendo a experiência de um ambiente totalmente lúdico, o que o faz discernir o seu papel nos dois contextos. Por outro lado, é comum vermos a ligação de jogos digitais violentos a crimes realizados fora do ambiente virtual. Mas cabe salientar que essa é uma situação atípica, visto que grande parte dos usuários não confundem os ambientes virtual e "real".
 
A questão é que os jogos digitais não podem ser mais considerados brinquedos, já que as mudanças são visíveis, desde o público que os consome até a construção dos produtos. Os jogos passaram a ser vistos como uma nova mídia que, tão promissora, despertou o interesse das indústrias de publicidade, cinema e editoria. Ver anúncios publicitários em jogos está cada dia mais comum, principalmente, naqueles que reproduzem ambientes urbanos ou de esportes, com base em imagens reais. O cinema, por sua vez, produz inúmeros filmes com histórias baseadas em jogos de sucesso, enquanto as editoras criam livros com o mesmo propósito, ou com dicas e curiosidades sobre eles. Assim, podemos claramente observar que o crescimento da indústria de games tem envolvido inúmeros setores atentos às mudanças tecnológicas, sem contar a campanha eleitoral do presidente estadunidense Barack Obama que apostou em outdoors e placas virtuais em diversos jogos on-line.
 
Quem sabe, num futuro, olhemos para trás com dificuldades para entender como era possível gostar de produções audiovisuais sem interação humana. E com isso, certamente, William Higinbotham não contava com o seu Tennis for Two.
 
Thífani Postali é mestra em Comunicação e Cultura e professora da Uniso. Autora de "Blues e Hip Hop: uma perspectiva folkcomunicacional" e membro do grupo de pesquisa Mídias, Cidades e Práticas Socioculturais (MidCid). Blog: www.thifanipostali.com.