CADERNO DE DOMINGO

A EFS e suas quatro estações

Giuliano Bonamim
[email protected]

Quatro estações historicamente importantes nos quase 100 anos de desenvolvimento da Estrada de Ferro Sorocabana estão atualmente em situações distintas. As edificações variam do abandono físico e operacional ao uso pleno e eficiente de suas estruturas.
O exemplo mais degradante é a estação de George Oetterer, antigamente chamada de Villeta. Essa parada foi inaugurada no último dia de 1876 e ligava a Fábrica de Ferro de São João do Ipanema a São Paulo. O prédio foi refeito em 1926 para a duplicação da linha e recebeu em 2001 a última viagem de trem de passageiros entre Sorocaba e Apiaí.
Atualmente, a estação está completamente abandonada. As paredes permanecem em pé, mas não há portas, janelas e telhado. O mato toma conta de seu interior e ao redor da construção.
Aproximadamente 15 quilômetros de trilhos ligam o antigo prédio de George Oetterer à Estação Ferroviária de Sorocaba. Este último, formado por um edifício de dois andares, situado próximo à região central, foi inaugurado em 1875 e entrou para a história do município ao ser a primeira construção de tijolos de Sorocaba. Antes, as casas e os comércios eram erguidos com taipa.
A estação sorocabana foi criada com dimensões menores às atuais. O fachada inferior do prédio tinha duas portas centrais, duas nas laterais e quatro janelas. No andar superior existiam oito janelas e, no centro, duas portas que davam acesso à uma sacada. O piso da calçada e do salão de entrada eram de arenito retirado de Ipanema. Ao passar pelo portão principal, o público encontrava oito guichês: os quatro do lado esquerdo vendiam bilhetes para a primeira classe e os do lado direito para a segunda classe. O passageiro mostrava o ticket a um funcionário, passava por uma roleta e entrava no pátio da estação para aguardar a chegada do trem.
Nessa área, havia bancos para a acomodação dos passageiros. Uma sala era reservada apenas às mulheres, com direito a banheiro privativo. Um outro cômodo, que vendia café, era destinado aos homens.
Antes de entrar no trem, cada pessoa mostrava novamente o bilhete ao chefe do trem. "Se o passageiro não tivesse o ticket na conferência dos funcionários durante a viagem, ele descia na próxima estação", diz Sônia Nanci Paes, diretora dos museus de Sorocaba.
No térreo da estação também funcionava o setor de comunicação da ferrovia. Já o andar superior era destinado às áreas administrativas. O aumento do tamanho da estação veio em 1930. A fachada também ganhou um visual mais bonito, com estilo "bolo de noiva". Uma área nova ficou destinada para o depósito de mercadorias.
Em frente à estação existia um jardim cheio de flores que interligava as casas dos funcionários da Sorocabana. Lá também era o estacionamento de cavalos, burros, carroças e veículos utilizados por passageiros e visitantes.
A falta de uso da estação deixou o local sem conservação. O edifício começou a ser restaurado em 2007 com a pintura interna e externa, a reforma do telhado e a troca dos vidros quebrados das janelas.
Agora, o local pode ganhar uma nova vida não apenas em sua estrutura física. Segundo a assessoria de imprensa da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), já está em fase de elaboração o estudo do projeto que visa a implantação da ligação ferroviária entre São Paulo e Sorocaba, com prazo de conclusão em um ano.
O estudo servirá para apoiar e dar as condições da viabilidade técnica para o empreendimento e a elaboração de um projeto funcional para esse novo serviço. Além disso, avaliará duas alternativas de traçados nos trechos parciais da atual linha Sorocabana/Fepasa. Mas, por enquanto, não há definições sobre o levantamento.
A CPTM ressalta que, após a conclusão desse estudo em andamento, serão necessárias avaliações de consolidação da demanda, econômicas e a modelagem financeira que suportem o empreendimento. Tudo isso para permitir a contratação dos projetos básico e executivo, licença ambiental e execução de obras.

Mairinque e Júlio Prestes

O projeto da CPTM também pode beneficiar a estação sediada em Mairinque, no caminho entre Sorocaba e São Paulo. O edifício, inaugurado em 1906, é considerado a primeira construção feita em concreto armado do Brasil. A estação também deu origem ao município e atualmente é a sede de um museu ferroviário. Ela é cercada por ramais de trilhos nos dois lados, que até hoje suportam o tráfego de trens de carga.
No inverso do ambiente de quase abandono das três estações está a imponente Estação Júlio Prestes, um dos cartões postais de São Paulo. O prédio atual, inaugurado em 15 de outubro de 1938, é um projeto do arquiteto Christiano das Neves. Entretanto, desde 1930, com a conclusão da área das plataformas, o embarque passou a ser feito na estação ainda em obras. Só em 1951 é que o nome Júlio Prestes foi adotado.
O complexo que hoje abriga o terminal da Linha 8 - Diamante da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) - entre as estações Júlio Prestes e Itapevi - e a Sala São Paulo nasceu de uma necessidade da antiga Estrada de Ferro Sorocabana. O objetivo era construir uma estação mais adequada ao transporte de passageiros e em harmonia com a arquitetura da cidade, no início do século 20.
A parte da plataforma da estação, situada à sua esquerda, serve hoje apenas como terminal dos trens da CPTM. Os escritórios, que abrigaram a Sorocabana e depois da Fepasa, desde 1997 são sede da Secretaria de Estado da Cultura. Em 1999, uma grande reforma transformou o amplo saguão na Sala São Paulo, a mais moderna sala de concertos da América Latina, que conta com 1509 lugares e mil metros quadrados de área.
A estação Júlio Prestes impressiona pela sua arquitetura. Em sua fachada está grafado o nome "Estrada de Ferro Sorocabana". A bilheteria ainda conserva a mesma cara dos anos 30, com uma fachada de madeira. Os lustres são de ferro, mesmo material usado nas portas e janelas. O terminal tem um pé direito de aproximadamente 20 metros de altura. E, lá dentro, é impossível não relacionar o ambiente ao visual europeu.

Estação da Luz

Ao lado, a uma distância de aproximadamente um quilômetro, está instalada a Estação da Luz. O prédio foi construído para integrar a São Paulo Railway, ferrovia fundada por Irineu Evangelista de Souza (Barão de Mauá) e dois associados - José Pimenta Bueno (Visconde de São Vicente) e José da Costa Carvalho (Marquês de Monte Alegre) para escoar o transporte da cultura cafeeira, que na época era feita do porto de Santos para o do Rio de Janeiro. Em 1860, teve início a construção da via férrea e, sete anos depois, as obras de 139 quilômetros de extensão foram concluídas somando um custo de 2 milhões de libras esterlinas.
A primeira unidade da Luz ocupava uma edificação acanhada e era chamada Estação São Paulo. Só a partir de 1901, data de inauguração do prédio atual, é que ela foi "batizada" oficialmente com o nome atual. Construída em frente ao edifício anterior, a Luz teve seu projeto criado por Charles Henry Driver. A maior parte do material usado na sua construção foi importado da Inglaterra e, por isso, a ferrovia ficou conhecida como "Ingleza". Itens como tijolos, madeira (pinho-de-riga irlandês), telhas, cerâmicas e as estruturas de aço mantêm, ainda hoje, uma arquitetura engenhosa e inconfundível.
Em 1946, um incêndio afetou grande parte do edifício. Durante as obras de recuperação, foi construído um novo andar que manteve o mesmo estilo da fachada. Hoje, mais de cem anos depois da inauguração, a Luz ainda é considerada um marco da riqueza do café e um dos mais importantes monumentos arquitetônicos de São Paulo.
Entre 2002 e 2005, a unidade foi restaurada. Todos os aspectos estruturais e históricos do edifício foram renovados. Moderna, hoje é parte do projeto Integração Centro, com liberação da passagem subterrânea. A medida facilita a transferência entre os sistemas da CPTM e Metrô, sem custo adicional, permitindo viagens mais seguras e confortáveis.