TURISMO

Reserva indígena recebe turistas e mostra cultura pataxó


 
A Reserva Indígena da Jaqueira, em Porto Seguro (BA), é uma opção de passeio para os interessados em se aproximar da cultura indígena brasileira - ideal, principalmente, para as crianças. A aldeia reúne cerca de cem famílias da etnia pataxó, que há 14 anos é preservada pelo governo federal dentro de uma área de 827 hectares de Mata Atlântica. O passeio é guiado pelos próprios índios e conta com trilhas pela mata, demonstração de caça e pesca com armadilhas e flechas, visitação às ocas do pajé e à escola, e proporciona ao visitante vivenciar os rituais da pintura do corpo e danças sagradas. O roteiro de 3 horas é finalizado com a degustação de um peixe assado, principal refeição dos pataxós.
 
Na entrada da aldeia um portal imponente informa "Território Indígena" e índios adolescentes, com cocares coloridos nas cabeças e com os corpos pintados de vermelho e preto, saúdam o visitante. O passeio começa a um quilômetro do portal - caminho percorrido a pé -, onde há várias ocas, construídas com taipa de pilão e cobertas com madeiras e palha. É lá que o visitante descobre, numa palestra informativa ministrada pelos índios, que algumas das ocas são destinadas para eventos religiosos e que outras ocas são totalmente fechadas porque servem de moradias aos índios zeladores, já que a maioria das famílias da aldeia reside mais distante, em meio a mata.
 
Mas é ali que o passeio fica interessante, principalmente para as crianças. Os índios mostram a oca do pajé, com cama de ripas de madeiras, uma fogueira e um armário simples e irregular que mostra a simplicidade dos costumes. Detalhe que, em plena era de tecnologia, uma folha de patioba madura sempre fica sob o armário. É que o atrito vertical da folha com o solo produz um som alto que serve como recurso sonoro para o pedido de socorro em caso de perigo. Já na trilha os índios mostram a horta, onde são cultivadas ervas medicinais, temperos e mandioca (eles não cultivam legumes e verduras) - ingredientes básicos da alimentação indígena.
 
Há também uma estufa simples, para cultivo de mudas de Pau-Brasil e outras árvores importantes como a Amesca, de onde é retirada a resina que é queimada, como incenso, durante rituais de purificação e casamentos. No circuito há exposição de várias armadilhas de diferentes tamanhos (para caça de animais como tatus, antas e onças), desenvolvidas pelos índios durante os séculos com o uso de madeiras, cipós e folhagens - mecanismos já desativados devido a obrigatoriedade da preservação da fauna atlântica. "Agora apenas plantamos, pescamos e criamos galinhas. Devemos proteger a floresta e seus animais", justifica Shohã Pataxó.
 
 
Manutenção da cultura
 
 
Mas para interagir com o turista, os índios ensinam o manuseio dos arcos e flechas, antes usados para caçar animais selvagens como felinos e outrora na defesa pessoal. No percurso há uma escola, parecida com uma oca, mas construída de alvenaria. É o único local onde há cadeiras, mesas, lousas, energia elétrica para televisão, computadores e banheiros convencionais, além de internet. "Há alguns anos estamos estudando nosso idioma, Pataohã. Estamos aprendendo a nossa língua porque quando nascemos, já aprendemos o português. Já recuperamos mais de três mil palavras", explica Shohã mencionando a vasta influência do "homem branco" junto à cultura indígena local.
 
Os índios que agora sobrevivem do turismo também expõem as peças artesanais feitas com o que a natureza oferece, como sementes, cipós e madeiras. Assim criam objetos de utilidade doméstica, como potes e colheres, além de cocares, pulseiras e outros adornos que variam de R$ 5 até R$ 100. O visitante voluntário também tem a oportunidade de ter o corpo pintado com pincéis, provenientes da piaçava, e tintas naturais, de pedras e plantas, como o vermelho da fruta urucum. Neste processo aprende-se que os desenhos espalhados pelo corpo têm significados como sentimentos, de alegria ou luto, e diferenciam casados de solteiros, assim como guerreiros, homens, mulheres e a escala hierárquica.
 
Mas é durante o ritual do Awê - que significa o amor, a união e a espiritualidade com a natureza -, que o turista tem mais contato com a cultura pataxó. A dança e o canto, com gritos do "hã-hã-hãe-Pataxó" são instrumentos de comunhão entre o povo e a natureza. É através desta cerimônia que os índios acreditam adquirir novas energias positivas da terra, do ar, da água, do fogo. O ritual tem por objetivo agradecer a presença dos turistas e os proteger de espíritos ruins. Os homens marcham à frente, mulheres e crianças atrás. A intenção é que os índios mais fortes fiquem à frente para proteger os demais seguidores. Turistas são convidados a participar da dança sagrada e marcham junto da tribo. O ritual emociona até os mais descrentes.
 
 
O peixe
 
 
O passeio só termina com a degustação de um peixe guaiuba - abundante no nordeste -, preparado pelos índios apenas com sal, enrolado em folhas de patioba (variante da palmeira), que quando quente, libera um óleo que ajuda a temperar o peixe, assado num fogão à lenha. Sem espinhos, o guaiuba é apenas desfiado e servido com farinha de mandioca. A empresária paulistana Cristina Palma não perdeu tempo e experimentou o prato indígena. "Um delícia, muito bom mesmo. Estava ansiosa para experimentar", disse ela que estava com a filha Isabela Palma e a amiguinha Clara Freisinger, ambas de 7 anos. "Esse passeio foi realmente inesquecível. Uma aventura, principalmente para as crianças que estudam isso nos livros", observou Cristina.
 
Já as crianças afirmaram surpresa ao conhecerem a rotina indígena e os porquês de seus costumes. "Achei a cama deles diferente. Muito dura", falou Isabela. Já Clara, que é resistente em comer longe de casa, afirmou ter gostado do peixe assado. Catarina Paiva, também de 7 anos, apreciou o ritual de pintura do corpo, a delicadeza com que os índios se preparam para cantar e dançar. "A gente nem sente eles nos pintando", falou. O passeio pela Reserva da Jaqueira custa R$ 35 por pessoa, mas crianças até 12 anos não pagam. Os índios atendem de segunda à sábado, sempre das 9h às 16h. A reserva fica a 12 quilômetros do centro de Porto Seguro, no km 77 da BR 367.