Regiane Alves ressalta o destaque de suas vilãs na tevê
Carolina Borges - TV Press
As feições angelicais facilmente poderiam encaminhar Regiane Alves para o óbvio papel de mocinha romântica. De fato, a atriz experimentou o posto algumas vezes como a doce Ana Clara, de Fascinação, do SBT, e a inocente Belinha, de Cabocla, da Globo. No entanto, a intérprete da moderna Renata, de Sangue bom, optou por outro caminho. E foi por suas personagens menos ortodoxas, como a Dóris, de Mulheres apaixonadas, e a Cristiane, de A vida da gente, que ela se destacou na tevê. "Tenho personalidade forte. Acho que é por isso que as pessoas dizem que tenho alma de vilã", argumenta, aos risos.
Aos 35 anos, a atriz, natural de Santo André, no ABC paulista, em nada lembra a menina tímida e insegura que estreou no folhetim que Walcyr Carrasco escreveu para o SBT em 1998. Tampouco a jovem que foi testada pelo diretor Ricardo Waddington na ânsia por uma oportunidade na Globo, em 2000. "Tinha propostas de outras emissoras, mas fiz um vídeo para ele. Três dias depois, assinei com a Globo", lembra. Sangue bom é o 20º trabalho de Regiane na emissora e marca o reencontro da atriz com um texto de Maria Adelaide Amaral responsável por A muralha. De lá para cá, a atriz percorreu uma trajetória marcada por personagens heterogêneas. "Pautei minha carreira pela versatilidade. Sou muito cuidadosa com o que faço. Me dedico para fazer minhas personagens acontecerem", garante.
P - Sua personagem em Sangue bom tem uma trama polêmica. Trai o namorado com o primo dele, às vésperas do casamento. Você teve receio de que a Renata fosse rejeitada?
R - Senti um pouco no início. Era um medo também dos autores. Por isso, eles fizeram poucas inserções de cenas do casal até o momento da traição. A cada cena eu deveria ser bem direta e apresentar a personagem nas sequências. Tínhamos uma preocupação de fazer um papel crível. Mostrar que era uma garota bacana e que, na verdade, essa história poderia acontecer com qualquer pessoa, independentemente do caráter.
P - Você estreou na Globo em A muralha de Maria Adelaide Amaral e com colaboração de Vincent Villari. É mais confortável trabalhar com autores que você já tem mais intimidade com o texto?
R - Claro, A muralha foi um trabalho muito feliz. Facilita para mim e para o autor, que já sabe como é o meu trabalho. Sou amiga do Vincent há anos, mas nunca consegui voltar a trabalhar com ele. Quando ele estava escrevendo, eu estava escalada para outro projeto. Foi muito carinhoso dos dois escreverem um papel pensado para mim. É muito gostoso, após 13 anos de Globo, alguém pensar em uma personagem com detalhes para você.
P - Sua personagem têm bases muito naturalistas. Como foi a construção para o papel?
R - Foi um trabalho bem detalhado porque a Renata tem muitas nuances. Queríamos mostrar uma garota comum e que não caísse para o estereótipo da periguete muito comum nas novelas atualmente. A história do Érico e da Renata é sobre o fim de uma relação de 15 anos. Vi um filme exatamente sobre isso, Entre o amor e a paixão. Montei o perfil de uma garota que não tem coragem de largar uma relação estável de anos. Há tempos que não tinha um papel tão dramático assim.
P - Sua primeira experiência na tevê foi como protagonista de Fascinação do SBT e, 10 anos depois, voltou ao posto em Beleza pura, da Globo. Você se considerava preparada na época para encarar uma personagem principal no início da carreira?
R - Fascinação era uma novela que nem era para ser exibida no Brasil. Era muito "verde" e não tinha a menor noção de televisão. Não estava pronta para a tevê. Percebi que precisava estudar muito ainda. Em 2008, minha trajetória na Globo era mais sólida. Já tinha feito de tudo aqui, desde a mocinha de época até a menina que maltrata os avós. Foi feita uma reunião na emissora e me falaram que faltava apenas esse posto. Mas não faço questão de ser protagonista.
P - Por quê?
R - É um excesso de trabalho muito forte e a qualidade da sua atuação cai um pouco. Quando você faz uma coadjuvante, tem mais tempo para estudar e montar a personagem. Na pele da protagonista, você tem de cumprir cenas, lidar com a pressão da audiência, de contar história e de estar bem. Não me faz falta. Não é uma coisa pela qual batalhe ou peça na Globo.
P - Mesmo com as feições angelicais, você é muito lembrada pelas vilãs que interpretou, como a Clara, de Laços de família, e a Dóris, de Mulheres apaixonadas. Por quê você acha que isso acontece?
R - O José Luiz Villamarim (diretor) diz que eu tenho alma de vilã (risos). Não sei se é porque é tão o meu oposto que acaba dando certo. Às vezes, me questiono porque me chamam para esse tipo de papel. Devo ter uma personalidade muito forte. Senão, as pessoas não me escalariam. Dez anos depois, o público ainda lembra da neta que maltratava os avós. Foi um divisor de águas na minha carreira. Gosto de ser lembrada pelas minhas vilãs.
P - A vida da gente foi a primeira vez que você pôde fazer uma comédia mais escrachada na tevê. Você buscava isso?
R - Teve uma época na minha vida em que eu queria fazer mais comédia. Eu procurei esse lado. As pessoas me falavam que eu tinha de cair para comédia, mas eu resistia. Achava que era muito próximo da minha pessoa e que aquilo não iria imprimir verdade. Eu adorei essa oportunidade em A vida da gente. Eu vi o quanto é difícil e injusto fazer comédia. Nunca são visto como bons e grandes papéis. Em Tempos modernos, eu já tive o início dessa abertura para comédia.
P - Tempos modernos foi uma novela sem grandes repercussões. Como você lida com as escolhas e os altos e baixos da carreira?
R - Isso é complicado. A personagem era muito legal dentro da trama, mas a novela não tinha sucesso. É difícil fazer um trabalho que não tem grande repercussão porque você ainda tem meses para levar esse projeto. Foi um fiasco, mas a turma era muito boa. Tinha algo positivo. No final, você sempre leva um ou dois amigos ou mais experiência. Nunca paro. Nem diante do sucesso ou do fracasso.
P - Ao longo da sua trajetória, você fez diversos tipos de papéis, desde as vilãs, passando pelas mocinhas até jovens descoladas. Essa versatilidade artística é importante para você?
R - Eu sempre busquei e busco. Quero papéis que não tenham nada a ver um com outro. É tudo muito pensado na minha carreira. Quero personagens que me instiguem e me façam viver histórias opostas a mim. Vou perder um pouco da minha vida para compor um trabalho. É a prioridade na minha carreira.
P - Walcyr Carrasco é um dos autores da atualidade que mais emplaca novelas na Globo e você estreou com ele na tevê. Nunca surgiu a oportunidade de trabalhar com o autor novamente?
R - Eu quase fiz A padroeira. Mas eu tinha acabado de sair de Laços de família e estava muito cansada. Sempre que tem uma novela dele, eu fico na boca para entrar, mas nunca vai. É a mesma coisa com a Glória Perez. Estava reservada até o último ponto para Salve Jorge, mas então o Dennis me reservou para Sangue bom.
P - Ser disputada por diversos autores envaidece?
R - Tenho muito os pés no chão. Acredito que sou muito cuidadosa com meu trabalho e isso é um reflexo. Amo o que faço. Trabalho independentemente do tamanho do papel. Acho que é isso que fica evidente nos projetos em que me envolvo. Mas ainda tenho muito o que melhorar, aprender e amadurecer. E claro que, com 13 anos de Globo, é muito bom saber que os autores gostam do meu trabalho.
Olho vivo
Com 10 novelas no currículo, Regiane Alves não é a principal telespectadora de seus antigos trabalhos. Após 15 anos de sua estreia em Fascinação, a atriz ainda encara como uma tortura rever seu primeiro papel de destaque na tevê. "É uma sensação estranha. É como ver foto antiga e perceber o quanto você melhorou. A novela era ruim e o Vincent me sacaneava", afirma, aos risos.
No entanto, a autocrítica ainda é muito comum na carreira de Regiane, que se considera uma pessoa extremamente chata com seu desempenho. "Sou presa a detalhes e sempre quero melhorar. Jamais pego texto na hora para gravar. Estou sempre com papel na mão e pensando em como ficar melhor", explica.
Más recordações
Regiane Alves experimentou os dois lados do sucesso da vilã Dóris em Mulheres apaixonadas. Apesar da grande repercussão da personagem na época, a atriz não escapou da fúria de algumas telespectadoras mais intepestuosas. Durante as gravações do folhetim de Manoel Carlos, Regiane chegou a ser agredida por uma senhora por conta da jovem que maltratava os avós. Mesmo com a confusão, a atriz garante que o público ainda deseja revê-la no papel de antagonista. "As pessoas na rua vivem me falando que eu deveria voltar a fazer vilã. A Dóris, com certeza, ficou guardada em um hall especial", ressalta.
* Sangue bom, Globo, segunda a sábado, às 19h15