ELA

Frances Mayes se prepara para lançar nova obra


 
Leila Gapy
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Pães, azeites, antepastos, queijos, carnes, pastas, muito vinho e, por que não, doces. Um digno e verdadeiro almoço italiano é composto por sete etapas. Sim, sete: dos aperitivos às sobremesas. Trata-se do saborear a comida, sempre fresca, claro. Um ritual que muitas vezes se estende pelo dia e demora de 6 a 10 horas. O objetivo, além de se alimentar fisicamente, com sabores e temperos da terra nostra, é também alimentar a alma, com conversas, cultura e muitas histórias. Tudo isso em meio a paisagens cinematográficas e arte. Não é por acaso que todo esse ritual de sensações ultrapassou os séculos e ainda hoje encanta gerações.
"A culinária italiana é um assunto interminável", diz Frances Mayes, escritora norte-americana que mudou-se para a Itália há 24 anos, onde escreveu nove livros, sendo seis deles sobre a Toscana. Tanto é que o primeiro livro, Sob o sol da Toscana, publicado em 1997 - onde ela conta a superação do divórcio, ambientado em Cortona, região de Arezzo  -, é best seller ainda hoje. Sem contar que, ao se transformar em filme (de nome homônimo), passou a ser também um dos mais vistos mundo afora. "A Itália tem tudo! A beleza fresca do campo, o relacionamento longo e natural dos italianos com a arte. A simpatia das pessoas. Foi fácil se apaixonar pela vida de um lugar tão inspirador", observa Frances, numa entrevista feita recentemente por email.
E essa paixão pelo país europeu foi tanta que Frances acrescenta que a experiência poderia render mais livros. "Eu poderia escrever mais um livro de receitas", fala ela mencionando o primeiro deles, feito junto do marido, o também escrito Edward Mayes, intitulado Tuscan Sun Cookbook, lançado em 2012 e disponível somente em inglês; onde ela descreve, não só o modo de fazer os pratos, como a história e a tradição local. "Mas eu provavelmente não escreverei mais sobre a Toscana; talvez sobre algum lugar ao sul da Itália que apareça em minha mente", avisa, na certeza de sucesso.
É que para a escritora, existe algo mágico no território italiano que vai além da reunião da história, belezas geográficas, culinária e sua gente. "Acho que o segredo, o meu mistério literário, seria o tempo. O tempo é longo na Itália e os dias se estendem em uma semana. Por isso eu tive tempo, tempo agradável, para escrever nove livros", avalia ela, sem desmerecer a própria escrita. "Mas eu acredito que o sucesso dos meus livros também tenha sido pela escrita e não somente pela Itália", pondera. Não é por menos. Aos 73 anos (segundo sites não-oficiais sobre a escritora), Frances provém de uma trajetória alicerçada no estudo da língua inglesa, literatura e escrita criativa.
Uma carreira iniciada na infância e juventude, quando lia seus "primeiros amores", como diz, referindo-se aos escritores John Keats, Sidonie Gabrielle Colette, William Butler Yeats, Gabriel García Márquez e Philip Arthur Larkin. E foi lendo e estudando que ela tornou-se mestre em inglês, o que levou-a a presidente do departamento de escrita criativa da Universidade Estadual de São Francisco (EUA), na década de 70, quanto também lecionou; além de editora e autora de matérias de jornais sobre receitas, viagens e poesias, como para o New York Times.
Mas isso não a impede de admitir que é uma eterna aprendiz. "Leio dois ou três livros por semana. Admiro muito Carolyn D. Wright, Lee Smith, Oscar Hijuelos, Michael Ondaatje, Cormac McCarthy, e o melhor de todos, o meu marido Edward Mayes, cujo poemas são incríveis obras da imaginação", derrete-se ela, que também ressalta ler escritores brasileiros. "Eu sempre leio Carlos Drummond de Andrade. Admiro o trabalho de Jorge Amado. E claro, não posso esquecer do modernista Oscar Niemeyer", afirma.
Textos que ela assume, são combustíveis para seus livros, apoiados em letras deslizantes de uma vida vivida intensamente. É que dos nove livros (e alguns livretos de poemas) escritos por ela, oito são autobiográficos ou apoiados em experiências próprias. Receita que a escritora arriscará mais uma vez, já que agora contará sobre sua infância, vivida na pequena cidade de Fitzgerald, na Georgia, sul dos EUA. "Acabei de completar Under Magnolia (Sob Magnolia, na tradução literal) um livro de memórias sobre minha infância no sul, que será publicado em 2014 no Brasil, pela Rocco".
Segundo o texto de divulgação do novo livro, é em Under Magnolia que Frances revisita momentos decisivos da infância e juventude que definiram seus primeiros passos na vida como escritora. O texto é um relato honesto e bem-humorado sobre a influência do clima, paisagem e costumes da Geogia, as primeiras amizades, além da força da família, caótica mas amorosa, composta pelos pais, a avó e uma empregada confidente. Neste contexto ela narra a própria trajetória entre a criança que foi, com uma alma pensante e secreta, e a libertação do próprio espírito, por meio dos estudos e da escrita.
O amor pelas viagens
E é essa liberdade que Frances faz questão de narrar, literalmente. Apaixonada pelo conhecimento, lançou mão de vários outros escritores mundialmente conhecidos para encontrar uma linguagem específica para escrever sobre aromas, costumes, belezas e comportamentos em, por exemplo, outro best seller: Um Ano de Viagens, publicado em 2007. "Li e reli Patrick Leigh Fermor, Freya Stark, Jan Morris, DH Lawrence, Lawrence Durrell. Neles eu pude explorar um interesse mais profundo: encontrar uma linguagem adequada", assume ela, que acrescenta: "Meu ideal de vida é desfazer a bagagem da minha última viagem e já começar a arrumá-la para outra. Adoro acordar em um país estrangeiro, sabendo que eu não posso prever o que o dia vai trazer. Eu sempre estou planejando uma viagem. E se não estou fazendo isso, estou lendo sobre outros lugares", diz ao admitir a paixão pelas letras e a curiosidade nata.
Aliás, Frances assume nunca ter visitado a América do Sul, mas afirma ter vontade de expandir os horizontes para o lado de cá do mundo. "Não viajei nem para o sul do Peru (uma vontade antiga). Mas eu encontro muitos brasileiros na Toscana e tenho conversado com amigos sobre uma viagem para o Brasil. Penso em fazer uma viagem para uma área mais selvagem do Brasil. Eu com certeza aproveitaria muito. O Brasil é um país tão vasto e tão variado", comenta ela que está prestes a realizar um sonho: viajar com a família (o marido, a filha, o genro e o único neto, de 11 anos), para o Vietnã e Camboja.
"Estamos (ela e o marido) numa missão de mostrar ao nosso neto as grandes cidades da Europa. No ano passado o levamos a Paris, Londres e Roma. Agora estamos pensando em Amsterdam, Lisboa e Roma - novamente, pois precisa-se de uma vida inteira para explorá-la -, além de cidades do Haiti", detalha. Mas como uma boa viajante - já que se divide entre a casa em Cortona (Itália), chamada de Bramasole, e a casa na Carolina do Norte, nos EUA -, ela não descarta a volta para casa. "Na Carolina do Norte, moramos pertinho da minha filha, Ashley (do primeiro casamento) e meu neto, de 11 anos. Então nos vemos várias vezes por semana e nos falamos diariamente. Isso tudo além de bons e longos dias em Bramasole, minha casa da Toscana, onde tenho um novo livro para explorar e a reforma para continuar".
É que Frances, que afirma se inspirar ao ouvir músicas clássicas e admirar pintores renascentistas como Signorelli e Piero della Francesca, também se entretem com a eterna reforma na tricentenária Bramasole, achada e descrita em Sob o Sol da Toscana. "Preciso mudar a cozinha e mexer no celeiro. Queremos uma casa com piscina. E também tenho que prosseguir a restauração do jardim histórico que cerca a casa", comenta ela que aproveita para dar uma dica: "Acho que às vezes, em meados da vida é emocionante mudar seu caminho. Se você já trabalhou no mesmo emprego 20 ou 25 anos, e começa a reparar nesses anos, talvez esteja precisando de um desafio. É sempre bom ter um plano, um sonho (como a reforma)", não finaliza, dando a deixa para prosseguir a prosa. (Com colaboração de Marina Costa)