CADERNO DE DOMINGO

Primeira eleição no Brasil aconteceu em 1532


 
A primeira eleição de que se tem notícia em território brasileiro ocorreu na Vila de São Vicente em 1532. Por meio dela, foram escolhidos os ocupantes dos cargos da Câmara Municipal. Os pleitos registrados no período colonial foram constantes na chamada América Portuguesa e se realizaram quase da mesma forma na maior parte do tempo. Só a partir de 1828, as eleições para a escolha de vereadores tiveram sua forma substancialmente alterada.

As casas legislativas ficavam nas sedes dos termos que, por sua vez, se inseriam dentro da circunscrição das Comarcas e funcionavam como órgão administrativo colegiado. Sua principal atribuição era a de arrecadar impostos e zelar pela defesa das cidades. Foi o que aconteceu, por exemplo, em 2 de novembro de 1641, quando a Câmara do Rio de Janeiro se reuniu junto com o governador Salvador Correa de Sá para deliberar sobre a melhor forma dos colonos contribuírem para "reparo e municionamento das fortalezas" que fariam oposição à ofensiva holandesa ao território brasileiro.

As Ordenações do Reino determinavam que os cargos das Câmaras Municipais deveriam ser ocupados pela nobreza da terra, também denominada pela legislação de homens bons. O professor e sociólogo Paulo Celso da Silva lembra que, neste caso, nobreza tinha outro significado. "Não se tratava, diz ele, da clássica concepção de linhagem, cuja qualidade era transmitida pelo nascimento. Vale dizer, não era a nobreza de origem".

Em Portugal, a ocupação dos cargos de governança era pouco atrativa como um canal de reconhecimento de nobreza. O mesmo não se pode dizer em relação à América Portuguesa, onde esses cargos foram praticamente o que restou aos colonos como mecanismo de nobilitação, de alcance de privilégios e honras.

Vêm daí, de acordo com o estudioso, as tradições que se tornaram vícios políticos e práticas que deram origem à forma de atuar hoje testemunhada nas casas legislativas. Homenagear pessoas com títulos de cidadania, nome de ruas ou conferir comendas acabaram se tornando a essência da atuação da maioria dos parlamentares.

Com isso, a função de fiscalizar os atos do Executivo e propor leis que atendam às expectativas da população, promovendo a melhoria da qualidade de vida e reduzindo as desigualdades ficaram relegadas a segundo plano. "Já foi muito pior, mas ainda hoje temos políticos que cumprem mandato e não encampam uma proposta mais consistente", comenta o professor Joel de Araújo.

O código eleitoral

Somente na década de 30, com a revolução, a busca de uma identidade eleitoral ganharia forma. Novas práticas foram incorporados ao processo político e, assim, o Governo Provisório criou uma comissão de reforma da legislação eleitoral, cujo trabalho resultou na elaboração do primeiro Código Eleitoral do Brasil.

O texto enfatizava a necessidade de se combater as fraudes e o caos eleitoral existentes até então, lançando o desafio de moralizar todo esse processo. O voto manipulado pelas elites oligárquicas haveria de se tornar um elemento de higidez do processo eleitoral. Para isso, o voto secreto foi considerada a grande garantia a ser dada pela recém-nascida Justiça Eleitoral.

Em 10 de novembro de 1937, sustentado por setores sociais conservadores, Getúlio Vargas anuncia, pelo rádio, a "nova ordem" do país. Outorgada nesse mesmo dia, a "polaca", como ficou conhecida a Constituição de 1937, extinguiu a Justiça Eleitoral, aboliu os partidos políticos existentes, suspendeu as eleições livres e estabeleceu eleição indireta para presidente da República, com mandato de seis anos. Essa "nova ordem", historicamente conhecida por Estado Novo, sofreu, entretanto, a oposição dos intelectuais, estudantes, religiosos e empresários.

Hiato

Durante dez anos, de 1935 a 1945, não houve eleições no país. Apenas em 28 de maio de 1945 é que a Justiça Eleitoral foi restabelecida por meio do Decreto nº 7.586. Nesse ano, Getúlio anuncia eleições gerais e lança Eurico Gaspar Dutra, seu ministro da Guerra, como candidato. Oposição e cúpula militar se articulam e dão o golpe de 29 de outubro de 1945.

Os ministros militares destituem Getúlio e passam o governo ao presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, à época também presidente do TSE, até a eleição e posse do novo presidente da República, o general Dutra, em janeiro de 1946. Durante esse hiato eleitoral a ênfase na relação cidadão/eleitor deslocou-se para relação cidadão/trabalhador.

Em 1950, um novo Código foi promulgado, e vigorou até 1964. O alistamento de eleitores passou a ser obrigatório assim como a retirada do título para todo cidadão maior de 18 anos. Em 1955, a Lei nº 2.250 criou a folha individual de votação, que fixou o eleitor na mesma seção eleitoral e aboliu, entre outras, a fraude do uso de título falso ou de segunda via obtida de modo doloso.

No mesmo ano, foi criada a cédula de votação oficial, embora fosse facultado aos partidos políticos fabricar e distribuir cédulas de acordo com o modelo enunciado pela lei. A cédula oficial guardou a liberdade e o sigilo do voto, facilitou a apuração dos pleitos e contribuiu para combater o poder econômico, liberando os candidatos de gastos com a impressão e a distribuição.

Diretas

O processo da transição democrática no fim do regime militar envolveu a abertura gradual idealizada. A transição se tornava inevitável à medida que engrossava o número daqueles que pressionavam e ansiavam pela mudança. Três forças atuavam nesse momento, mas a principal delas foi as campanhas pelas Diretas.

As Diretas-Já! foi um movimento em favor de eleição direta para o cargo de presidente. Foram feitas manifestações públicas (comícios e passeatas) em várias cidades brasileiras ao longo do ano de 1983 e 84, que mobilizaram mais de cinco milhões de pessoas. Um dos objetivos pontuais era pressionar a aprovação da Emenda Dante de Oliveira pelo Congresso. Restabelecidas depois, as eleições diretas levaram o país à redemocratização.

A partir de então, tornaram-se comuns os debates entre os candidatos acompanhados pelos eleitores que passaram a ter mais condições de avaliar o perfil de cada um antes de votar.

Outra evolução no processo eleitoral brasileiro foi a proibição, pela Justiça Eleitoral, das bocas de urnas no dia da eleição, o que deixava a cidade suja de papeis e provocava, inclusive, discussões entre "boqueiros" pelos melhores pontos de abordagem do eleitorado nas proximidades dos locais de votação. (José Antonio Rosa)