História da menina Julieta Chaves será tema de livro
Maíra Fernandes
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Conhecida como a "Santinha de Sorocaba", a história da menina Julieta Chaves, que foi assassinada em março de 1899, será tema de um livro assinado pelo pesquisador Carlos Carvalho Cavalheiro e pela artista plástica Flávia Aguilera. No momento, ambos captam mais informações e buscam ajuda de parentes, conhecidos da família e de devotos da "santinha" para concluírem a biografia da menina enterrada em um dos túmulos mais visitados no Cemitério da Saudade. "Levantamos algum material sobre a biografia e o crime, mas estamos ainda coletando informações sobre a devoção. Seria importante, então, que pessoas que conhecem a história da Julieta, que tiveram alguma graça alcançada ou que saibam de alguém que conseguiu, que entrem em contato conosco para nos ajudar com essas informações", pede Cavalheiro. Ele reitera que a pesquisa é séria e que preservarão as fontes que não queiram ser identificadas. "Em verdade, queremos ouvir essas histórias e entender como se construiu essa devoção e de que forma a menina Julieta Chaves ganhou a fama de milagreira."
O historiador, que já havia escrito uma breve biografia de Julieta em seu livro Folclore em Sorocaba, de 1999, acabou voltando a se interessar pela história por conta de um contato de Flávia, que havia iniciado uma pesquisa pela história da menina e foi procurar mais informações com Carlos. "Quando eu era criança a minha babá me levava toda semana ao Cemitério da Saudade. Ela me contava sobre a menina Dinorá, o Zé Arrepiado, Julieta e outras histórias, mas a que eu mais gostava e me causava um lance de mistério era a da Julieta, pois tinha foto dela. Em março deste ano fui ao cemitério e queria ver a capelinha da Julieta novamente, e voltou tudo, todas as lembranças das histórias que ela (babá) me contava. Então cheguei em casa e fui procurar a história da Julieta em arquivos de jornais e comecei a encontrar muita coisa. Desde então, não parei mais de procurar e encontrar coisas interessantíssimas", explica Flávia, que foi até o Gabinete de Leitura Sorocabano atrás de informações da época, quando falaram da pesquisa de Cavalheiro.
"Quando a Flávia entrou em contato comigo ela perguntou do livro que eu escrevera sobre a Julieta. Informei a ela que pretendia escrever algo sobre, mas que faria isso futuramente. Não estava nos meus planos começar esse trabalho agora, até porque tenho outros projetos na fila. Mas começamos a trocar informações e sugeri que em vez de dividirmos o nosso trabalho, que o fizéssemos juntos. Afinal, dos dois lados havia um material interessante que poderia ser melhor aproveitado se juntássemos os nossos esforços. E daí surgiu a parceria", conta Cavalheiro, explicando que grande parte da pesquisa foi levantada por Flávia. Cavalheiro transcreveu diversas edições dos jornais da época e, também, de algumas décadas depois que falavam da construção da primeira capela que cobriu o túmulo de Julieta.
O historiador possuía anotações de referências em livros e artigos, além de textos da internet, e Flávia entrou em contato com os familiares de Julieta e conseguiu alguns documentos e fotos, além de relatos orais de histórias da família, e edições de outros jornais que estavam disponíveis na internet. "Hoje essa ferramenta facilita muito o trabalho de pesquisa", reconhece Cavalheiro.
Resgate histórico
Para o livro, cuja previsão é de ser concluído no fim do próximo ano, os dois já realizaram uma reunião para definir qual seria a cara da obra, e esquematizaram a divisão dos capítulos. Mas, além dessa biografia, Flávia também irá desenvolver, por meio de desenho, um álbum de fotografias de Julieta, a partir da reconstrução da história da menina. "O livro que eu e o Carlos estamos fazendo é dividido em três capítulos: Biografia, Crime e Devoção. Já o meu outro trabalho é feito só com meus desenhos, como se fosse as fotos da vida dela mesmo", adianta Flávia. Para agilizar o processo de pesquisa, ela deixou um livro de pedidos e agradecimentos na capelinha de Julieta no cemitério, e já comemora a adesão dos devotos, que estão escrevendo.
Para o historiador, resgatar essa história é também resgatar a cidade de outros tempos, o que ajuda a entender a identidade da comunidade. "Podemos pinçar dessas histórias muito do imaginário e do comportamento e mentalidade do povo sorocabano do final do século 19 e ao longo do século 20. A necessidade de compensar a morte trágica da menina elevando-a a um grau de santidade popular é como um grito que ecoa do passado longínquo para dizer a nós o quanto esse crime chocou a nossa sociedade", diz. "Ademais, a crença na intervenção dos mortos em nosso favor remonta a épocas imemoriais, como salienta o pesquisador Fustel de Coulanges, quando trata da sociedade e religiosidade da Roma Antiga. Penso que o catolicismo popular, que se desenvolveu nas cidades brasileiras, demonstra a ânsia pelos modelos de santidade. E a menina Julieta é apenas uma entre os tantos similares que existem pelo Brasil afora", conclui Cavalheiro.
Biografia de Julieta
Num dos túmulos mais visitados no cemitério da Saudade está enterrado o corpo da menina Julieta Chaves, conhecida como a "Santinha de Sorocaba", em vista dos milagres atribuídos a ela. Julieta, de oito anos de idade, foi estuprada e morta pelo professor João Vieira Pinto em 18 de março de 1899.
Contam que um italiano, chamado Pascoal, que trabalhava num sítio próximo ao terreno onde foi encontrado o corpo de Julieta (na confluência das atuais ruas Santa Clara e Nogueira Martins), quase foi linchado por ser suspeito do assassinato. O Monsenhor João Soares do Amaral conteve a multidão.
Depois de seu discurso, teve sua mão beijada pelo assassino verdadeiro, o professor João. Isso despertou as suspeitas na população. Algum tempo depois ele foi preso e confessou o crime bárbaro. No local onde Julieta foi morta, ergueram uma cruz e o povo acendia velas e pedia por milagres.
A fama de milagreira se espalhou e, ainda hoje, a menina Julieta recebe a devoção de muitos fiéis que alcançaram graças.
Contato
Há uma página no Facebook intitulada Santinha Julieta, com a história de Julieta e com espaço para que devotos contem sobre as graças alcançadas. O email do historiador é [email protected].