Cristian Budu sobe ao palco do Municipal
Felipe Shikama
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Primeiro brasileiro da história a vencer o cobiçado Concurso Internacional de Piano Clara Haskil, na Suíça, o pianista Cristian Budu se apresenta hoje, às 20h30, no palco do Teatro Municipal Teotônio Vilela, em Sorocaba. O recital faz parte da temporada Schaeffler Música. Até o fechamento desta edição ainda havia ingressos, que custam R$ 20 (inteira).
Na apresentação, o músico vai interpretar Impressões seresteiras e Festa no Sertão, do brasileiro Heitor Villa-Lobos, e peças do alemão Robert Schumann (Kreisleriana) e do polonês Frédéric Chopin (24 prelúdios). "Eu apresentei esse mesmo programa no Festival de Inverno de Campos do Jordão e na semana que vem vou repeti-lo em um festival da Alemanha. É um programa que eu gosto muito", comenta o músico paulistano formado pela USP e que há quatro anos mora em Boston, nos Estados Unidos, onde concluiu o mestrado em performance pianística pela New England Conservatory.
Além de defender a música brasileira de Villa-Lobos, algo que faz com frequência em várias partes do mundo - principalmente quando atende ao "bis" pedido pelo público -, Cristian Budu assinala que as composições românticas de Schumann e Chopin estão entre suas favoritas porque são capazes de construir narrativas "quase autobiográficas". "O que eu gosto nessas duas grandes peças é o percurso pelas quais elas passam. Por meio de pequenas peças, de uma em uma, esse percurso vai sendo traçado e a música gera na sala um momento de transe. São duas peças com as quais eu me identifico muito, porque elas passam por vários momentos diferentes e até controversos. São obras cruciais na vida desses compositores", afirma.
Budu revela que demorou para se acostumar com o fato de ter vencido, em 2013, um dos concursos de piano mais importantes do mundo: o Clara Haskil. "Não foi fácil para mim, porque o músico está acostumado a ter uma vida privada e de muito estudo. De repente [com a conquista do prêmio], você passa a ter mais atenção e a ser mais procurado. Deu um certo susto", comenta o artista, que em 2007 já havia vencido o programa Prelúdio, da TV Cultura, e em 2010, também faturou o 1º lugar no Concurso Nelson Freire. "Me sinto uma pessoa com muita sorte. Tive a chance de ganhar e deu essa repercussão interessante", completa.
Atribuindo seu verdadeiro talento à "sorte", Cristian Budu aproveita o momento em que tem os holofotes em sua direção para defender e divulgar a música brasileira. Morando em Boston, o artista integra o quarteto Choro Bastardo no qual, curiosamente, ele deixa o piano de lado para impor o ritmo no pandeiro.
Recentemente o grupo de chorões, alguns deles norte-americanos, conquistou o Wild Card Ensemble Honors Competition, do New England Conservatory. A premiação incluiu a gravação de um CD e uma série de apresentações, incluindo um recital no aclamado Jordan Hall. "Eu sempre gostei de choro. Além disso, a música popular e a música folclórica sempre foram fontes de inspiração para a música erudita. Esse grupo é formado por músicos extraordinários, então eu estou sempre aprendo coisas novas", resume.
Budu revela que seus primeiros contatos com o pandeiro e outros instrumentos de percussão típicos da música popular aconteceram no início da adolescência, aos 12 anos, quando teve aulas do multi-artista Antonio Nóbrega, no Instituto Brincante. "Eu fiquei encantado com esse universo das tradições populares brasileiras. Isso me influenciou bastante e cheguei a ir a Recife para pesquisar as tradições, como os caboclinhos, o frevo e o maracatu", conta o artista, assinalando que a sua "entrega de corpo e alma à música" é exatamente a mesma, seja ela popular ou erudita.
De volta ao piano, Cristian Budu vê com preocupação os crescentes e acentuados fenômenos de elitização e "frieza" pelo qual a música erudita passa. "Eu tenho a impressão de que a verdade artística proposta pelos compositores, que está relacionada com a vida e o significado do ser humano, está se perdendo." Segundo ele, o preconceito de boa parte dos músicos tem sido um dos principais responsáveis por distanciar a peça escrita das intenções e sentimentos dos próprios compositores. "Quando alguém lê um livro, é livre para imaginar o que quiser. Se está escrito "árvore" você imagina a sua árvore. Não precisa que alguém te diga como e qual árvore você deve pensar. Mas infelizmente essa limitação de criatividade e liberdade está acontecendo com a música erudita. Por isso, na minha opinião, ela vai cada vez mais se fechando em si mesma", compara o artista.
Já no sentido de desconstruir a ideia de elitização empregada à música erudita, Cristian Budu integra em Boston o projeto Grupmuse, no qual um grupo de musicistas participa de apresentações nas casas das pessoas. Por meio do site www.groupmuse.com, os anfitriões se cadastram para abrir as portas ao grupo e demais interessados podem visitar para ouvir música e conhecer novas pessoas. "O projeto vem dessa vontade de fazer música num ambiente íntimo e que as pessoas vivenciem com naturalidade, sem pedantismo."
Budu planeja trazer a iniciativa ao Brasil, mas reconhece que algumas adaptações ainda estão sendo estudadas, já que diferentemente da população de Boston, no qual 60% é formada por jovens universitários, os brasileiros têm mais resistência em abrir a porta de suas casas para pessoas desconhecidas. "Queremos resgatar a tradição do sarau, mas usando ferramenta que é moderna, que é a internet. Ao mesmo tempo, a gente ajuda a aumentar a rede de pessoas que gostam de música clássica", conclui.
Serviço
O pianista Cristian Budu apresenta recital de piano hoje, às 20h30, no Teatro Municipal Teotônio Vilela. Os ingressos custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia) e podem ser adquiridos na loja Livros e Cia (Shopping Iguatemi Esplanada) e no Conservatório Rogerio Koury (rua Pernambuco, 154). O Teatro Municipal fica na av. Carlos Reinaldo Mendes, s/nº - Alto da Boa Vista.