Paineira ainda vive na memória de moradores
"Não há como olhar para trás, fechar os olhos e não ver sua beleza", afirma Nilson Roberto Rodrigues, 55, ao relembrar a paineira (Chorisia speciosa), de aproximadamente 150 anos, que deu nome ao bairro Árvore Grande. Hoje, no local, há um clone da árvore que foi retirada completamente da avenida São Paulo em 2008. Nascido em Sorocaba e vivendo parte da infância no bairro, Rodrigues, hoje professor, conta sobre a época que ainda era aluno e passava pela árvore durante o trajeto até a escola. "A paineira servia de abrigo ao guarda sorridente e amigo que apitava, na década de 60, logo ali abaixo na faixa, para que nós, crianças e alunos, pudéssemos atravessar com segurança a avenida."
A árvore, segundo Rodrigues, num passado remoto, era também abrigo aos índios que por ali viveram e aos sertanistas, tropeiros e bandeirantes. Posteriormente o local tornou-se ponto de encontro de casais de namorados, relembra. Assim como a árvore, que já não existe, muitos dos que dividiram parte dos seus dias e da sua sombra imensa já partiram. O professor relembra que a árvore esplendorosa era responsável por dar vida ao bairro. "Feliz aquele povo simples que diante da pergunta "De onde você vem?", respondia sem pestanejar: "Da Árvore Grande"."
Com os galhos capazes de atravessar a avenida São Paulo, a saudosa árvore era decorada com lâmpadas natalinas pelos moradores, como recorda Indyara Pereira. Ela lamenta a morte da paineira, mas se mostra feliz por ter vivido bons momentos sob a árvore grande. "Lá tínhamos pipoqueiros e vendedores de algodão doce que deixam as lembranças ainda melhores."
De geração em geração
Entre as décadas de 70 e 80, a tal árvore grande também foi cenário de encontros familiares e abrigou momentos de cumplicidade e ternura entre avô e neto. O professor universitário Edgar Domingo de Albuquerque, 42, conta que a copa da paineira oferecia sombra para que ele e seu yayo (que é vovô em catalão) passassem horas fazendo companhia um ao outro. "Ele costumava ir a um atacadista que havia na avenida São Paulo para comprar queijos, azeitonas e embutidos. Eu sempre o acompanhava nessas compras, íamos a pé de nossa casa na Vila Haro. Fazíamos as compras e, entre os itens comprados, meu yayo sempre pedia dois gomos de salsichão. Colocávamos os itens nas sacolas e atravessávamos a avenida, logo em frente a árvore grande", recorda.
Como forma de recompensa pela ajuda nas compras, Edgar ganhava a oportunidade de ouvir as lembranças de seu avô. "Sentávamos na mureta da árvore grande e, num ritual que era só nosso, comíamos cada um um gomo de salsichão." Ele relembra que algumas vezes os dois ficavam apenas em silêncio, observando os carros que passavam pelo local. Em outras situações, o patriarca contava histórias de Barcelona, da guerra ou dos lugares onde ele havia trabalhado antes de vir para o Brasil. "Hoje em dia a árvore grande não está mais lá, assim como meu yayo também nos deixou, mas as lembranças desse tempo vez ou outra vêm à tona."
Coincidência ou não, Edgar é professor na Universidade de Sorocaba (Uniso), local que recebeu um dos clones da paineira da árvore grande, cultivados pelo coordenador do Núcleo de Estudos Ambientais da Uniso, Nobel Penteado de Freitas. "Passo por ela nos dias que leciono no campus e ao vê-la me recordo do som da voz do meu yayo contando suas histórias." O clone plantado na avenida São Paulo também faz parte do percurso do professor, que deixou de morar na Vila Haro há aproximadamente seis meses. "Essas árvores seguem fazendo parte do meu caminho da roça", brinca.