ARTIGOS

A educação ambiental contra o desenvolvimento sustentável




Rodrigo Barchi

Há um célebre texto de Bertold Brecht sobre a verdade, escrito nos anos 30, onde ele aponta, em um magnífico trecho, que as pessoas que são contrárias ao fascismo sem ser contra o capitalismo, são as mesmas que querem comer a vitela sem matar a bezerra. Afirma Brecht que as pessoas não contestam as relações de propriedade, mas somente a barbárie em si, sem levar em consideração que essas próprias relações são as promotoras da barbárie, e, portanto, do próprio fascismo.

Não é preciso fazer nenhum contorcionismo teórico para comprovar esse posicionamento, já que desde a ocupação das Américas pelos europeus, passando pela tragédia do neocolonialismo em África e Ásia, os totalitarismos do século 20, até chegarmos ao combate contra o terrorismo internacional, e a miséria se ampliando globalmente devido à internacionalização do neoliberalismo, há barbáries sobre barbáries, promovidas pela centralização brutal do poder em defesa das grandes corporações transnacionais.

E essa crítica à associação dos governos nacionais às grandes empresas internacionais foi realizada com grande propriedade e barulho pelos movimentos ecologistas internacionais, os quais, a partir dos anos 60, ganharam atenção dos aparelhos midiáticos. Consequentemente, a ecologia tornou-se verborragia nos discursos dos chefes de estado, dos políticos e do empresariado.

Principalmente após a criação do conceito de desenvolvimento sustentável, pelo relatório Brundtland, de 1987, da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ecologia, do dia para a noite, de uma inimiga do empresariado e da governança estatal, transformou-se em boa aliada da manutenção do poder e das desigualdades inerentes ao capitalismo.

Quando os movimentos ecologistas - aliados aos movimentos pacifistas, antimilitaristas, feministas, negros, indígenas, estudantis e pela diversidade sexual - trouxeram suas preocupações ao restante da sociedade, estavam contestando as relações patriarcais, sociais, culturais, políticas e econômicas que são as promotoras da predação sobre o meio ambiente. A educação ambiental como uma das ferramentas de combate à destruição do planeta foi proposta por esses movimentos na busca de outras relações entre os humanos, e entre nós e os outros seres que compartilham o planeta conosco.

No entanto, há um movimento crescente, em âmbito governamental e corporativo, pela troca do conceito de educação ambiental pela noção de ""educação para o desenvolvimento sustentável"", gerando um risco grave de retirar toda a força conceitual, teórica, prática e transformativa das perspectivas ecologistas de educação.

Apesar de todo o ""bom-mocismo"" ecológico personificado nas propagandas de bancos, empreiteiras e até frigoríficos, o desenvolvimento sustentável não se mostra capaz de contestar nossas práticas mais barbáricas e fascistas contra o meio ambiente, como a desigualdade social, a centralização política, a matança de animais para o consumo das populações, o desrespeito para com a diversidade, além de nossa irrestrita despreocupação com a demasiada quantidade de pessoas no planeta e seu futuro.

O ecocapitalismo que sustenta a noção de educação para o desenvolvimento sustentável consegue superar o horror narrado por Brecht, pois se antes se lamentava a morte da bezerra, hoje não se lamenta mais, pois se ela foi assassinada, pelo menos o foi a partir de ""práticas humanitárias"" de abate. Será que é para isso que e o pseudo esverdeamento do capitalismo nos prepara, não para nos dar qualidade de vida, igualdade e justiça, mas para nos abater de modo menos cruel?

Rodrigo Barchi é doutor em Educação pela Unicamp, mestre em Educação pela Uniso, especialista em Educação Ambiental pela EESC-USP e coordenador do curso de Geografia da Uniso. ([email protected])