CULTURA

Museu de Arte Sacra: um museu que clama por abrigo


Com mais de três mil fotos e 350 peças, sendo 181 imagens sacras dos séculos 17 a 19, livros, partituras, missais e diversos objetos, entre os quais se destacam a cadeira de Frei Galvão, um órgão pertencente ao antigo Mosteiro de Santa Clara, a imagem de São Jorge em tamanho natural e os três Estandartes da Misericórdia, o Museu Arquidiocesano de Arte Sacra de Sorocaba - Comendador Luiz Almeida Marins (Madas-LAM) está há décadas aguardando um espaço adequado para finalmente poder funcionar. Desde junho do ano passado, a situação se tornou mais crítica porque o diretor Pedro Benedito Paiva Júnior foi destituído do cargo e não há ninguém em seu lugar, já que se trata de trabalho voluntário.

Fechado para o público há 15 anos e para pesquisadores desde junho de 2017, o Museu de Arte Sacra está passando por uma reestruturação, conforme disse o padre Tadeu Rocha Moraes, pároco da Catedral Metropolitana de Sorocaba, onde está localizado o museu. "O museu praticamente não existe mais. Museu é despesa sem retorno, infelizmente", disse, assim que foi informado pela reportagem da intenção de fazer uma matéria sobre o tema. "O que posso dizer é que no momento as peças estão sendo catalogadas e feito o inventário. Não é hora de ir até lá", disse, respondendo à solicitação de visita ao espaço.

Em outro momento, mais pra frente, ele disse que conversaria com a reportagem sobre o assunto, mas mesmo assim deixou claro que a equipe não teria acesso ao local.


Em 2009, foi realizada uma exposição no Espaço São Bento com peças do acervo. Foi a última vez que o público em geral pôde ver algumas obras do museu - ERICK PINHEIRO / ARQUIVO JCS (10/7/2009) Em 2009, foi realizada uma exposição no Espaço São Bento com peças do acervo. Foi a última vez que o público em geral pôde ver algumas obras do museu - ERICK PINHEIRO / ARQUIVO JCS (10/7/2009)

A responsabilidade pelo museu é compartilhada entre o padre Tadeu e o arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba, dom Julio Endi Akamine. A reportagem também tentou contato com o arcebispo dom Julio para entrevistá-lo e fazer visita ao museu, mas sem sucesso. Foram feitas várias tentativas na quarta-feira (7) para falar com ele. O motivo da ligação foi explicado para a secretária e ela disse que havia falado para dom Julio, mas ele não teria dado resposta a ela. Mesmo assim, a secretária garantiu que até o final do dia haveria um retorno, o que não ocorreu. Na quinta-feira (8) foi feita nova tentativa e a secretária do arcebispo informou que ele ainda não tinha respondido a ela a solicitação da reportagem.

Em junho do ano passado, o padre Tadeu suspendeu o acesso de pesquisadores ao museu por tempo indeterminado, em virtude do afastamento do diretor financeiro e administrativo do museu, Pedro Benedito Paiva Júnior. Até então, pesquisadores ainda podiam consultar o acervo, mediante autorização e acompanhamento do ex-diretor.

Impasse desde a década de 80


Um grande entrave do Museu Arquidiocesano de Arte Sacra, situado no andar superior da Catedral Metropolitana, sempre foi a escada em espiral, considerada perigosa para acesso do público. Além disso, o local não oferece condições adequadas de iluminação e de espaço para o funcionamento efetivo de um museu. Por esses motivos, desde a inauguração, em 1975, esse local era para ser provisório.

O impasse sobre a localização do Museu Arquidiocesano de Arte Sacra dura há décadas. No período em que o diretor era o professor Marcos de Afonso Marins, ele publicou um artigo no dia 11 de outubro de 1987 no jornal Cruzeiro do Sul falando da possibilidade de levar as peças para um dos prédios ligados ao Mosteiro de São Bento, que abrigava antigamente a 3ª Companhia da Polícia Militar. Houve uma mobilização nesse sentido e a Prefeitura de Sorocaba chegou a anunciar que seria feito um convênio, em que seriam feitas parcerias entre o órgão municipal, o Mosteiro de São Bento e a Universidade de Sorocaba (Uniso), que ficaria responsável pela administraçaõ do museu. Em 2005 o imóvel, que pertence à Ordem Beneditina, foi desocupado para abrigar o museu. Em 2007, a situação ainda estava indefinida. Em 2009, ainda havia esperança do acordo se concretizar. No dia 10 de julho daquele ano foi inclusive realizada uma exposição no Espaço São Bento com peças selecionadas do acervo. Foi a última vez que o público em geral pôde ver algumas obras do museu.

A proposta na época era que a Prefeitura pagasse aluguel pelo prédio, o que seria uma forma da Ordem Beneditina manter o acervo ali. No entanto, as tratativas não foram pra frente.

Depois, no dia 12 de janeiro de 2014, Pedro, então diretor do museu, anunciou que tinha conseguido um espaço para o acervo: a Capela Sagrada Família, situada na Vila Jardini.

O espaço, que estava desocupado, foi cedido pelo padre Wilson Roberto após a inauguração da nova igreja, situada ali perto, na rua Curupaiti. A mudança estava autorizada pelo arcebispo Dom Eduardo Benes Sales Rodrigues. Para isso seriam necessárias algumas adaptações no local para adequá-lo.

No dia 14 de maio de 2017, outro revés: o padre Wilson Roberto Silva anunciou que a área foi repassada a uma incorporadora, como permuta de um terreno no Campolim, onde deverá ser construído um complexo arquitetônico composto pela Igreja de São Pio de Pietrelcina, espaço das cinzas dos fiéis falecidos, e a sede própria do Museu Arquidiocesano de Arte Sacra de Sorocaba Comendador Luiz Almeida Marins (Madas-LAM).

Essa informação, no entanto, não é confirmada pelo Padre Tadeu. No dia 18 de agosto de 2017, em entrevista ao G1, gravada em vídeo, ele afirmou que não existe definição sobre o local que irá abrigar esse acervo.


Um dos destaques do acervo é a cadeira de Frei Galvão - ARQUIVO JCS (21/6/1985) Um dos destaques do acervo é a cadeira de Frei Galvão - ARQUIVO JCS (21/6/1985)

Para o historiador Adilson Cezar, que já fez parte do Conselho Consultivo do museu, o que tem acontecido com esse acervo é o mesmo que vem acontecendo nas outras instituições: o sorocabano não está interessado em manter sua história, em valorizar as suas origens. "Se ele tivesse interessado, faria pressão política e as autoridades tomavam ciência do que está acontecendo", disse, fazendo questão de frisar que como há muito tempo não é mais membro do Conselho, está falando como um cidadão sorocabano, que preza pela história de sua terra.

Ele lembra que durante um período, em que foi professor da Universidade de Sorocaba (Uniso), alunos do curso de história atuavam no local como estagiários. "Hoje estou de fora da universidade e não sei como estão procedendo, mas seria uma forma de manter o museu aberto, útil, limpo, enfim...".

*O Mais Cruzeiro iniciou em dezembro a série de reportagens "Espaços de memória", sobre os patrimônios históricos de Sorocaba. O material é publicado toda sexta-feira e tem como objetivo mostrar a situação dos imóveis (e acervos), falando sobre suas atividades.