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Nutritivo, versátil e barato, o amido de milho da inconfundível caixinha amarela de Maizena está no nosso dia a dia desde o Brasil colônia


Por MARCO MERGUIZZO

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Presente no cotidiano dos lares por todo o país desde a época colonial, a inconfundível caixinha amarela de Maizena chega aos 162 anos ainda como campeã das preferências do brasileiro, perpetuando-se no paladar nacional sob a forma de pudins, cremes, mingaus, doces, massas de bolos e biscoitos passadas de geração em geração.

Não, não há nenhum equívoco ou erro de revisão no seu nome de batismo. Embora os dicionários apontem que a palavra maisena deva ser grafada com "esse", é com a letra "zê" que um dos nossos mais populares patrimônios culinários se tornou conhecido. Comercializado nas mercearias e armazéns brasileiros desde 1874, antes mesmo de a República ser implantada, o amido de milho de Duryea foi batizado de Maizena, assim mesmo com "zê", uma alusão à palavra "maíz", que significa milho, em espanhol. O vocábulo tem origem no nome científico da planta que o origina: a Zea mays.

Embora cada região do continente americano adotasse um nome para o cereal - cujo berço é comprovadamente o território mexicano pré-colombiano, no qual Maias, Astecas e Incas teriam sido os primeiros a cultivá-lo e a saboreá-lo amplamente no seu dia a dia -, o termo empregado pelas tribos Sioux e Iroquês, que habitavam o sul dos Estados Unidos, foi o escolhido pelos conquistadores espanhóis para designar a planta dos "grãos dourados preciosos" levados por Cristovão Colombo ao Velho Mundo.

A mesma inspiração foi usada na embalagem de Maizena. A cor amarela da caixa remete aos grãozinhos da espiga e a ilustração clássica, desenhada a bico de pena, exibe a cena de uma tribo de índios norte-americanos extraindo amido, como os seus antepassados.

DE TÃO POPULAR, AS CAIXINHAS AMARELAS VIRARAM SINÔNIMO DE AMIDO DE MILHO


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Em sua existência secular, de mais de 16 décadas, a tradicional caixinha amarela de letras pretas ficou gravada na memória de gerações de brasileiros tanto quanto o gosto dessa farinha especial presente sobretudo sob a forma de pudins, cremes, mingaus, papinhas de bebê, doces, biscoitos e bolos.

De tão popular, a marca virou sinônimo de amido de milho, assim como Gillete para lâmina de barbear e Bombril para palhinha de aço. Mais: entrou até para a literatura contemporânea do país. O "Analista de Bagé", o impagável personagem do escritor gaúcho Luis Fernando Veríssimo, se autodefine como "um freudiano de carregar bandeirinha mais ortodoxo do que rótulo de Maizena".

Tradicionalíssima, nutritiva e, melhor, aliada de confeiteiros e donas de casa por seu amplo e versátil uso culinário (veja no final deste post a aplicação do amido de milho na cozinha e suas principais funcionalidades), a Maizena tem um longo e curioso percurso, cujos primórdios remetem à Revolução Industrial.

Ainda na primeira metade do século XIX, o pó obtido a partir da farinha de milho misturada à água formava uma goma que servia para encorpar as roupas e tecidos recém-saídos dos teares da emergente indústria têxtil inglesa. Para atender à demanda das fábricas que se multiplicavam pelas ilhas britânicas, os pioneiros William Brown e John Polson decidiram aprimorar o produto.

Fundaram uma refinaria e chegaram a um processo que resultava num amido excelente para as tecelagens e lavanderias domésticas, que passaram a empregá-lo no lugar das estruturas de arame que sustentavam vestidos, camisas e casacos pregueados. Com um pouco mais de apuro, transformava-se até em alimento. Branquinho após ser refinado, foi lançado no mercado como farinha de milho Brown & Polson.

Do outro lado do Atlântico, o norte-americano Thomas Kingsford, ex-funcionário de uma refinaria de milho, abriu sua própria fábrica para produzir não só a goma de milho mas o amido para o setor de alimentos. Encarregado de manutenção da fábrica de Kingsford, Wright Duryea pediu demissão e fundou a mais nova concorrente do antigo chefe: a fábrica de amido Rio Oswego.

Dois anos depois, Duryea recrutou a família para ampliar os negócios e fundou a Companhia Produtora de Amido Duryea. Seu carro-chefe era a Duryea Maizena, um amido para uso culinário doméstico, embora, na época, o produto fosse mais popular na lavanderia para engomar roupas.

VERSÁTIL NA COZINHA, O "OURO BRANCO" VIROU O QUERIDINHO DAS DONAS DE CASA


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A caixinha amarela fez sucesso imediato entre as donas de casa, ganhando prêmios de qualidade. Em 1859, a Maizena começou a ser exportada para vários países do Velho Continente. Em 1906, as empresas de Duryea e Kingsford passaram a integrar o grupo norte-americano Corn Products Refining Company, e mais tarde apenas Corn Products Company (CPC). Duas décadas depois, a novidade chegaria ao Brasil. 

Vendida nas mercearias do país entre pilhas de batatas e tomates, as caixinhas amarelas logo causariam boa impressão nas donas de casa por seu multiuso culinário. Servia para engrossar caldos, dava um bom mingau, substituía a farinha de trigo no preparo de bolos e, na falta de goma, deixava as camisas perfeitas.

O sucesso foi inevitável e logo a marca viraria sinônimo de amido de milho, entrando de vez nos lares brasileiros, livros de culinárias e nas receitas caseiras passadas das avós para as mães e destas para as suas filhas, geração após geração.

Foi esse cenário que o engenheiro L. E. Miner encontrou ao chegar ao Brasil, em 1927. Representante da CPC, ele veio a São Paulo para descobrir se era viável abrir uma fábrica de amido de milho por aqui. Até então, o produto era produzido exclusivamente nos Estados Unidos e embalado no país. Três anos depois, a Refinações de Milho Brasil (RMB), subsidiária da CPC, começava a funcionar na capital paulista.

Com a fundação da primeira fábrica brasileira e a ampla aceitação e popularidade da Maizena no país, a CPC tentou impedir o uso indiscriminado da marca em alimentos que não contivessem Maizena em sua fórmula. Caso do biscoito homônimo, já bastante popular à época, porém, neste caso, sem êxito. Tamanho prestígio fez com que o produto passasse a ser usado, durante a II Guerra Mundial, pelos padeiros do país por causa da falta do trigo importado. A solução foi usar a Maizena para fazer o pão.

INGREDIENTE FUNDAMENTAL NO MINGAU E NA PAPINHA DO BEBÊ



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No entanto, a vocação de alimento infantil se consolidaria, nas décadas seguintes, através de lançamentos como a mistura para mingau Cremogema, em 1957, e a farinha enriquecida Cerealina, em 1965, esta campeã de vendas na região Nordeste do país, onde a desnutrição infantil assombrava as famílias.

No fim da década, seria a vez do "trio elétrico": a mistura de amido, leite e açúcar que, transformada em mingau, alimentou a infância de gerações de brasileiros. Paralelamente, a marca passou a investir em outra imagem. 

Desde a década de 1960, o produto deixou de enfatizar as papinhas de bebê para enaltecer a versatilidade do amido de milho. "Maizena faz tudo mais gostoso", diziam os anúncios, ilustrados com imagens de tortas, ensopados e sobremesas.

Livros e revistas de receitas, calendários e cartelas com pratos rápidos lançados ao longo dos anos 60, 70 e 80 tentavam disseminar novos cardápios, nos quais a Maizena era o ingrediente secreto. Resultado: viraram artigos de coleção para uma legião de consumidoras fãs do produto.

No período entre as décadas de 1970 até o ano 2000, quando a marca foi amealhada pela gigante Unilever, foi incorporada uma série de novos produtos à família Maizena como bolos, bebidas, barras de cereais, farinhas e mingaus infantis, visando a atender as preferências e os hábitos das novas gerações de consumidores. Mas a caixinha amarela e o "ouro branco" nela contida continuaram imutáveis.

Só em 2005, as embalagens da marca ganharam toques de modernidade, sem perder, porém, a identidade visual firmada na tradição de sua história. O novo logotipo incluiu o desenho de um coração, simbolizando em boa medida a relação de reciprocidade e fidelidade cultivada há mais de 150 anos, de modo quase incondicional, entre esta líder de mercado e seus leais consumidores. Afinal, como apregoou uma de suas campanhas mais conhecidas: "Você conhece, você confia."

UM ALIADO DE PRIMEIRA HORA DE CONFEITEIROS E DONAS DE CASA


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Culinariamente versátil e funcional, além de nutritivo, o amido de milho é o nome que se dá à farinha feita a partir desse cereal, que na cozinha pode substituir a farinha de trigo, por ostentar características espessantes e aglutinantes, no preparo de cremes, flans, pudins, mingaus, molhos doces ou salgados, biscoitos amanteigados, sequilhos, tortas, massas de bolos, salgados, panquecas e sopas cremosas.

Em sua elaboração, os grãos são molhados e a seguir retiradas as cascas e as plântulas embrionárias. Após secarem, são triturados e moídos até se transformarem em uma fina farinha. "Por não conter glúten, o amido de milho também é excelente alternativa para substituir a farinha de trigo em receitas para celíacos, que são susceptíveis à proteína", aponta Heloisa Rodrigues, coordenadora do curso de Gastronomia da Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo. "Além disso, confere maior leveza às massas de alguns bolos e biscoitos", elogia.

Na confeitaria, sobretudo, o produto é amplamente utilizado e valorizado, integrando várias receitas. De cremes e massas de bolos a flans e coberturas, já que além de ser ótimo espessante é de fácil cozimento. Neste caso, a Maizena vai bem, portanto, na confeitaria em cremes, bolos de pasta americana, coberturas e nos moldes usados para a confecção de balas de goma, cujo poder aglutinante serve de "berço" para o recheio de licores.

Em contraponto, as coberturas que levam amido de milho gelatinizam com o calor do forno, "quebrando" a textura, não podendo também ser congelada, pois perdem soro após saírem do freezer. Tal predicado culinário, porém, o credencia para substituir a gelatina em molhos doces e salgados, cremes, flans e coberturas.

Ao ser submetido à fervura, torna-se transparente, não interferindo na coloração e dando brilho nas produções onde é aplicado. "Além disso, não tem sabor e confere textura leve e aveludada", enumera ainda Heloisa este outro atributo desse superaliado na cozinha de confeiteiros e donas de casa.


LINHA DO TEMPO: MAIS DE UM SÉCULO E MEIO À MESA

Década a década, a trajetória da Maizena, um patrimônio culinário campeão de popularidade

1874

O amido de milho Maizena Duryea, importado dos Estados Unidos, começa a ser vendido no Brasil. Em 1889, a marca é registrada no País.

1900

Nos primeiros anos do século XX, a Corn Products Company (CPC) incentiva padeiros e fabricantes de biscoitos a usar Maizena em suas receitas.

1927

A popularidade de Maizena leva a CPC a montar uma fábrica para produzir o amido de milho no país. Até então, ele era apenas embalado aqui.

1930

A Refinações de Milho Brasil, subsidiária da CPC, começa a operar no Brasil, "nacionalizando" a Maizena.

1947

Mas de 80% das donas de casa consomem Maizena, segundo pesquisa do Ibope feita com 5,5 mil mulheres do Rio de Janeiro e São Paulo.

1950

A TV Tupi é inaugurada. A marca patrocina o programa Sabatinas Maizena, transmitido até 1968. Testes, quebra-cabeças, adivinhações e atividades são as atrações dos Cadernos Maizena, publicados pela marca durante a década e dedicados aos "meninos estudiosos do Brasil".

1956

A marca Maizena completa um século de existência. Slogans publicitários como "Há 100 anos alimentando gerações" marcam o evento.

1960

Com nova estratégia, o slogan "Maizena faz tudo mais gostoso" enfatiza a versatilidade do amido de milho e não apenas a alimentação infantil.

1970

Na mesma linha da década passada, campanhas divulgam receitas de pratos salgados e não apenas as de sobremesas e alimentos infantis.

1983

Maizena publica a revista "Nossas Receitas". O consumidor leva embalagens do produto à banca de jornal mais próxima e troca pela revista. O slogan do momento é "Você conhece. Você confia".

1991

A Refinações de Milho Brasil adquire a marca Arrozina, farinha bastante popular nas regiões Norte e Nordeste.

1994

No ano em que a marca completa 120 anos, Maizena patrocina a Seleção Brasileira de Futebol Feminino. Pé-quente, o time canarinho conquista o título de campeão sul-americano. No ano seguinte, chega ao bicampeonato, ainda com o apoio da marca.

2000

A Unilever incorpora o grupo norte-americano Bestfoods, que à época controla a Refinações de Milho Brasil, proprietária da marca. Com isso, Maizena passa a integrar o portfólio da holding.

2003

Maizena lança uma farinha láctea, produto nutricional voltado ao público infantil. Surgem as barras de cereal Croc'z, com o selo de qualidade Maizena.

2007

As embalagens de Maizena Cremogema são renovadas, com novos personagens em 3D e a imagem da fruta correspondente ao sabor.

2009

A embalagem de Maizena passa a incluir o selo Minha Escolha, aprovado pela Ong Choices International Foundation e OMS (Organização Mundial da Sáude), visando a estimular o consumo consciente. Nesse mesmo ano, a marca adere à campanha mundial em prol do aleitamento materno, iniciativa que sela o vínculo da marca com a infância brasileira.
 
2012
 
Uma vez mais, a caixinha passa por pequenas mudanças, quase imperceptíveis, no seu layout. E ganha destaque a frase: "Faz mais do que você imagina!", ressaltando a grande versatilidade e aplicação culinárias do produto na cozinha. 

Fonte: Centro de História Unilever 
 
 
+ RECEITA


BOLO DE CENOURA COM COBERTURA DE CHOCOLATE 


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PARA A MASSA


2 cenouras médias, cortadas em cubos médios (250 g). 1/2 xícara (chá) de óleo de milho. 3 ovos. 1/2 xícara (chá) de amido de milho. 1 e 1/2 xícara (chá) de farinha de trigo. 1 colher (sopa) de fermento em pó. 1 xícara (chá) de açúcar

PARA A COBERTURA

1/2 xícara (chá) de chocolate ao leite derretido (ainda quente). 1/2 xícara (chá) de creme de leite.

PREPARO


1) Preaqueça o forno em temperatura média (180°C). 2) Unte e enfarinhe uma forma de furo central média (20 cm de diâmetro). 3) Reserve. 4) No copo do liquidificador, coloque a cenoura, o óleo e os ovos, e bata até ficar homogêneo. 5) Em uma tigela, peneire o amido de milho, a farinha de trigo, o fermento e o açúcar, junte a mistura de cenoura reservada, e mexa com o auxílio de uma espátula até que vire uma massa uniforme. 6) Disponha a massa na forma reservada e leve ao forno por 35 minutos, ou até que um palito, depois de espetado na massa, saia limpo. 7) Retire do forno e deixe amornar.

PARA A COBERTURA

Misture o chocolate e o creme de leite, espalhe por toda a superfície do bolo e sirva a seguir.
 

(*) Marco Merguizzo é jornalista profissional especializado em gastronomia, vinhos, turismo e estilo de vida. Confira outras novidades no Instagram (@blog 1gole1garfada1viagem) ou clique aqui e vá direto para a página do blog no Facebook